As vezes a conta não fecha

- "Ás vezes a conta não fecha.

As vezes a conta não fecha mesmo."

Foi o que escutei da minha psicóloga na última sessão.

Contadora que sou de formação, jamais imaginei deixar um balanço por fazer, as vezes não fecha, e quando não fecha algo errado há.

O trabalho só termina quando fecha.

Precisa fechar.

E lá estava eu, querendo fazer o mesmo com as minhas questões.

Eu estava me exigindo fechar uma conta que de fato não fecharia nunca.

Não fecharia porque a vida não obedece ao método das partidas dobradas.

Não fecharia porque a vida não se resume a CPC's, NBC's, IFRS's e mais uma caralhada de normas.

Não fecharia, porque na vida, diferente da contabilidade, cada débito não corresponde a um crédito de igual valor.

E eu preciso resistir a tentação de querer fazer fechar.

Na vida só a partida, contrapartida nem sempre existe.

Balanço se encerra a cada exercício, na vida os encerramentos não obedecem predeterminações.

Vida é orgânica, contabilidade não.

Algumas metáforas não cabem.

Preciso resistir a tentação de fazer correspondências.

Depois dessa fala, encerramos a sessão, o silêncio me tomou.

A fala tão certeira ressoou.

E todas as vezes que me pego querendo insistentemente esgotar alguma questão, querendo alcançar uma compreensão que por vezes ainda não me é possível, eu digo baixinho: "As vezes a conta não fecha, Mari."

Não é redondo, sabe? Não tem exatidão.

A vida é imprecisa que nem a contabilidade.

E nem sempre tolera ajustes como tal.

E aí, eu silencio como silenciei naquela sessão.

E reaprendo a sustentar a dúvida, a imprecisão, as não-conformidades.

Mariany Mendes
Enviado por Mariany Mendes em 07/10/2020
Código do texto: T7081941
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