Centro e Zonal Sul: duas faces do Rio de Janeiro
A duas regiões da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, fundada em 1565 por Estácio de Sá, têm seus encantos e, historicamente, legaram dois estupendos gêneros de nossa boa música. Mais jovem, a Zona Sul nos deu a Bossa-Nova. Provecto, o Centro nos brindou com o Chorinho. Nisso se distinguem as duas zonas da cidade: o Centro com sua beleza, a Zona Sul com seu charme. Esta é sensual, nesse caso, a beleza é prescindível, o que mais se conta são as formas “espirituais”. A beleza, não, mais complexa é a matematização do ideal, a adequação das formas, o delírio celeste como afirma Platão.
O Rio, então, ou melhor, essas duas regiões podem representar muito bem o par beleza e charme. Nesse sentido, as duas famosas zonas do Rio parecem duas mulheres distintas. Maravilhosas, porém ciosas de suas virtudes.
A mulher charmosa é impactante, envolvente, encantadora, feiticeira. Seus feitiços impedem um olhar que alcance a raiz de sua magia, daquela graça que manipula emoções, sentimentos, paixões. A mulher charmosa provoca estados d’alma avassaladores, tal qual a chuva de verão: destrói paisagens antigas para formar outras mais novas. A poesia da Zona Sul é síntese do encontro entre mar, montanha, floreta, arquitetura e escultura. Inebriante. Qual homem, em sua doida existência, nunca foi arrebatado por uma mulher charmosa e seu sorriso provocante?
No polo contrário está o Centro do Rio, representado pela mulher de dotes helênicos.
A mulher bela exala geometrização de si mesma. Delicada, seu aroma sai suavemente das linhas do seu rosto, do sorriso contido, do olhar firme e do sentimento de cuidado que inspira o manuseio sensível de mãos experientes; precisamente, de dedos delicados. O impacto causado pela mulher bela não é barulhento. Sua natureza reflexiva exige concentração na contemplação do todo, nos detalhes enquanto elementos do conjunto.
A mulher bela é tão poética quanto à mulher charmosa, porém, sua natureza não é a rima melódica do som das ondas do mar que quebram na praia, mas o conceito filosófico que nasce da introspecção do olhar impactado pelas multiplicidades dos elementos da estética. A mulher bela só pode ser compreendida pelo espírito da filosofia: o silêncio da suspensão do sujeito deste mundo para outro de fabulosas essências presas à perenidade.
Assim, o Centro do Rio exige, ao contrário da Zona Sul, olhar atento em que o vagar desliza sobre cada pedra de suas ruas que contemplam as colunas do amor; paredes que escondem quotidianos; monumentos erigidos ao heroísmo; igrejas que exalam o sagrado; prédios de linhas clássicas; portas que abrem desejos; janelas que desfraldam sabores; portões encobertos pelo barulho das vidas diluídas e aflitas.
O nosso alcaide não entende do Rio, porque ele mora na Barra, e como tal, não tem identidade definida, não é bela e nem charmosa, apenas muito bem vestida: anda sob a moda importada.