Roteiro
Quero iniciar pedindo licença e agradecer.
Licença por entrar neste universo da palavra.
Agradecer por aqueles que me alfabetizaram.
A vida é um roteiro inacabado, assim como qualquer palavra que mora na língua e nasce entrelaçada.
Sou desses que procurar ler com o pouco que aprendi.
Uso óculos, não para corrigir, mas sim para enxergar os pequenos detalhes.
Às vezes, pensou que sou o narrador.
Noutras, aceito os diálogos entre protagonistas e coadjuvantes, sinto-me um figurante.
Tenho escutando o silêncio como quem mata a fome.
Às vezes, fico empanturrado. Noutras, até vomito.
Tenho vários defeitos. Entre eles, leio devagar.
Amo quem escuta, embora nem sempre amo e mesmo escute.
O roteiro é frágil.
Viajo para Bogotá, mas acabo mesmo em Tupanciretã.
A vida leva para o interior.
O roteiro é repetitivo.
Há dias que o sol brilha, outros dias não há nada.
Dias esquecidos na memória. Escrevo e esqueço.
Às vezes, acredito que sou um roteirista. Noutras, um coveiro.
Ando preocupado. Comecei a acreditar em algumas coisas.
Quando percebo estou convicto. Graças a Deus o tempo é rei.
Ando confundindo as meias, esqueço os nomes, renomeio.
O roteiro é confuso.
Troca data, inverte o lado e até canta parabéns no dia errado.
Ainda bem que durmo. Sonho acordar para escrever, porém tenho preguiça e geralmente esqueço de anotar. Depois invento o que sonhei. Ninguém acredita, nem eu.
Esses dias abri um livro. Jurei que era eu. No final, eram dois. Não sei quem ficou ou saiu. Deu medo! Já pensou não saber quem leu? A única solução que achei foi emprestar o livro para outro ler. No início fiquei aliviado mas, alguns dias depois, ele devolveu o livro sem o final. Bom, aí não sabia o que fazer: escrever ou aceitar aquilo sem fim? A saída foi entrar no personagem e brigar com o roteirista. Mas o convite de entrada esqueci em casa. Pensei que era mais confortável me abrir para o coadjuvante, assim evitava o monólogo. Ele queria ser mais, do que adianta? Certo mesmo é o figurante, nasce e morre, ninguém é importante.
Mas tudo depende do roteirista, velho sacana pervertido e sem face. Se esconde nas cenas e ri baixo.
O roteiro é fraco.
Não tem título e copia com autenticidade. Hoje li o manual de uma peça, mas ela continuou sem encaixe. Vou no mecânico, acho que ele sabe para onde ir. Se não for ele, quem mais pode viver sem uma peça? O mecânico é o cara. Deve até saber fazer um roteiro melhor do que faço. Volto a pedir licença e me despeço. Quando encontrar tempo escrevo e agradeço quem lê esse manifesto.