Nonagésimo sétimo dia

"A quarentena de um poeta"

Nonagésimo sétimo dia:

Aproximara-se dos meus cem dias de quarentena e o sol que embelezara o céu também ilumiara Maria que cedia aos seus encantos, todavia, ainda não chegara a hora de partirmos ao nosso cafofo que recebia as gotículas inofensivas salgadas transportadas pelo vento.

Restara então, encarar as ruas do movimentado bairro bem localizado da Baixada Fluminense para invadir a horta dos nossos ricos nutrientes a encher a mala do automóvel com a couve que convidara o seu amigo alface que arrastara consigo o avermelhado fruto tomate que dava carona aos poderoso gengibre e a cenoura que era impreterível para a conservação da pele bronzeada de Maria Alice.

Bebemos uma água de coco super gelada tão recomendada para nos hidratar e proteger os meus rins dos cristais que outrora quase me findara.

Por ser um sábado, ninguém abria mão das suas resenhas de boteco e o voltar para casa foi a ter a sensação que tudo estava normal.

Fora-me prometido uma saborosa macarronada e eu retribuíra com uma deliciosa limonada suíça que molhava os nossos beijos.

A cada dia eu admirava cada vez mais cada passo daquela mulher que me encantara há vinte anos quando numa manhã de verão, Deus a me presenteou.

Os meus olhos vidrados achegaram aos seus enquanto suas meninas sorriam para os meus. As minhas mãos procuraram as suas que cederam despidas e suadas a se juntar ao frio das palmas e ficaram para sempre algemadas. A cada olhar havia uma certeza que era mesmo uma dádiva esmerada pelas mãos da nobreza e entregue ao coração do plebeu e para sempre nos tornamos uma carne só, uma aliança, uma unidade, um nó.

Eu não poderia esquecer o dia que a flor sorriu para mim perdida entre espinhos e o seu repente anunciou uma mirada de amor. Ao tocar em suas pétalas com o côncavo de minhas mãos, a flor sorriu de novo e acelerou o meu coração. Transportei-a então para o seu jardim banhado pelos raios do céu e na metade do caminho, outro repente, em meus lábios, estames de mel.

Permaneci atado e quando acordei estava ao lado da flor que me apaixonei.

Beijos e mais beijos

Quero me besuntar com o seu batom

A sua bocarra na minha boca fechada

Como o pão que saiu da primeira fornalha

No fim da madrugada

Quero o café da manhã na mesma cama

O chuvisco das águas mornas no mesmo lugar

A toalha gigante a nos secar

No instante que retorno a te beijar

E outra vez quero me lambuzar de beijos

E mais beijos, beijos e mais beijos

Ed Ramos
Enviado por Ed Ramos em 20/06/2020
Reeditado em 20/06/2020
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