O título é você
“...e nessa hora você vai lembrar de mim…”
Meu vizinho vai fundo com Roberto Carlos,
eu os odeio,
principalmente o vizinho,
mas com esse som estridente
é impossível não escutá-los
e sentir a tristeza me rondando,
confortante,
atraente,
ardilosa.
Na verdade,
nunca consegui saber realmente
se ela chega em certos momentos
ou se está dentro de mim,
mas a considero como
uma espécie alter ego
que quase nunca dorme.
Olho para o teto branco,
e no mesmo instante percebo
que nem todo o Black Metal do mundo
poderá me salvar agora,
e não é só por causa do Roberto,
esse vinho de última categoria também conspirou para me afundar.
Subitamente, lembrei-me do rosto de uma colega poetisa de São Paulo.
Eu poderia te dizer que ela é linda,
mas isso é besteira.
Ela é Don Corleone, gemendo para Bonasera: “Veja, eles massacraram meu garoto.”
Ela é Jesus sendo beijado com ternura por Judas.
Ela é Kurt Cobain, explodindo os próprios miolos.
Você me entende?
Meu último email ainda não foi respondido,
não falo com ela há meses.
Não sei se foi a Covid-19
ou a minha inconstância que a fez sumir.
Quase sofro por isso.
Se eu não soubesse que absolutamente tudo não passa de merda,
eu me perderia em labirintos de lamentos.
Não aprendi tal coisa na escola,
nem na faculdade,
mas descobri que você tem dois caminhos
para não sofrer tanto em noites confusas e
tentar compreender ao menos 1% da sua própria existência e
do que se passa o seu redor:
Fé absoluta
ou tomar uns tragos pesados e se apoiar na beleza perigosa do niilismo.
Ou isso,
ou vida te derruba e te estupra sem dó.
Encho o meu copo,
deito, e enquanto a cama gira só para mim,
penso nos cabelos tempestuosos dela
e sinto o peso da vida
bem aqui, dentro dessa cabeça
que não quer muita coisa
além de parar de funcionar.
“...Mas você vê o meu sorriso mesmo assim
e tudo isso vai fazer você lembrar de mim…”