OS GRANDES E ETERNOS AMORES
O cafezinho foi, como sempre, servido sem nenhum tipo de acompanhamento. Apenas um café, sem açúcar e mais nada.
Antônio sorveu a bebida, recolocou a xícara sobre o balcão e já estava de saída quando foi abordado pelo rapaz que lhe havia entregado a bebida.
– Posso lhe perguntar uma coisa, seu Antônio – indagou o funcionário da padaria.
– Claro, meu filho. O que é?
– O senhor vai me desculpar, mas já faz mais de um ano que o senhor passa por aqui todos os dias, mais ou menos a esta hora, e pede sempre um “cafezinho puro”.
– Outros clientes não fazem a mesma coisa?
– Cafezinho puro, muita gente pede. Mas não todos os dias e nem no mesmo horário como o senhor sempre faz. Nunca come nada pela manhã?
– Claro que como.
– Nunca o vi comendo nada aqui na padaria. Se come em casa, por qual motivo sempre vem aqui para tomar um cafezinho? O nosso café é tão bom assim?
– Eu não “venho” aqui tomar um cafezinho todos os dias – disse Antônio sorrindo.
– Não entendi o que o senhor quis dizer com esse “Não venho aqui tomar um cafezinho” – comentou o balconista sem entender ao certo o que o cliente queria dizer com aquela frase.
Estou querendo dizer que não “venho”; eu apenas “passo” aqui para tomar o café. Digamos que este café é apenas um “aperitivo”. Café de verdade, com pão e manteiga, vou tomar daqui a pouco.
Está me dizendo que passa aqui antes de ir para... o trabalho? Desculpe, mas o senhor não me parece ter mais idade para trabalhar. Ou tem? – voltou a indagar o rapaz.
– Já estou aposentado há alguns anos.
Houve então um instante de silêncio entre os dois homens.
Em seguida Antônio voltou a falar.
– Daqui a pouco vou tomar café com minha esposa. Ela está em uma clínica de repouso aqui perto. O café de lá é servido às nove.
Antes que viesse por parte do balconista mais algum tipo de questionamento, Antônio adiantou-se:
– Ela está com Alzheimer.
– Alzheimer?! O que é isto?
– É uma doença faz as pessoas irem perdendo aos poucos a memória. Algumas, como é o caso de minha esposa, passam a nem reconhecer as pessoas que estão à sua volta. Não reconhece nem os próprios filhos...
– E a sua esposa reconhece o senhor?
– Infelizmente não.
– Se a sua esposa não sabe nem quem o senhor é, por que então vai até lá todos os dias tomar café com ela?
– Ela não me conhece mais, mas eu a conheço, e muito bem. E isto para mim já é muito. Os grandes amores, por vezes são assim mesmo: não são uma estrada de mão dupla; têm mão única. Mas este sentido único é o suficiente quando amamos intensa e verdadeiramente alguém.