Festa tardia

Tarde demais

para remorsos,

para a vã

nostalgia

dos retratos

em sépia

esquecidos

nas mesas

de canto

das salas.

O sabor

de um passado

esplêndido,

temperado

com ervas finas

escapou-me

ao paladar

que não mais

desfruto.

A penumbra

ampla da casa,

em fracas luzes

me bebe as lágrimas

da estranheza

na certeza

sólida

da solidão,

mas posso,

contudo,

imaginar pessoas

ausentes

e com elas

conjugar,

festejar

o tempo

em sua forma

pretérita.

Tontas alegrias,

bêbadas aforias

se atiram

aos sofás,

se abraçam,

se riem

das derrotas

do mundo.

Tilintar de taças,

tintos vinhos

da Borgonha.

A bruma

que contente

grassa

feito fumacê

fumaça,

entorpece

os presentes,

dignifica

as notas

amadeiradas

do tabaco.

A finesse

sonora do jazz

de manso piano

move os pés

dos comensais

que, aos pares,

conversam.

São narrativas

entusiasmadas,

pautadas pela

brilhantura

de acertadas

decisões.

Madrepérola

nos botões

dos vestidos

de festa

das senhoras.

Bem cortados ternos

risca de giz

passam ao largo,

ao triz

das desventuras.

Rediviva,

a lembrança

deita-se

como pó

no frio

assoalhado,

inunda-me

as narinas

entope-me

a traqueia.

De súbito,

o desconvite

ao regalo

de ser e

de estar.

Silêncio!

A campainha

está tocando.

O mordomo atende.

— Senhor, são eles.

Finalmente chegaram

para o festejo.

Chegaram todos,

ainda que tarde.

Felix Ventura
Enviado por Felix Ventura em 28/05/2020
Código do texto: T6961108
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