A fome
A fome inventara os esfomeados. Muitos famintos, de tanta fome, já morriam de parto, outros teimavam em nascer. Era o sétimo, doutros já idos. Não era o momento daquele rebento, mas ele viera, insistente. De raquitismo e anemias e beribéris foi crescendo, atrofiado a contar o tempo pelos pratos aflitos que servia. Logo cedo, já grande, quando o dia mal raiara, empunhava cartazes a migrar ao semáforo para implorar o fim da réstia. Tenho fome, dizia. Mas fome não tinha, pois o corpo aprendera a viver sem comer, e só se dava em dores quando muitos dias passavam sem o sabor de sorver. Vivera assim a vida toda, a mendigar comida. Aprendera com os pais, também famintos. Não teve filhos nem mulheres. Não teve ninguém. Morrera como os outros. Padeceu como nascera. Eram os mortos da fome.