O inferno da saudade

Próximo a janela, com os braços cruzados contra o peito agitado, Jesse observava a chuva forte e nostálgica.

Odiava dias como aquele: Céu escuro, o som frenético da água chocando-se contra o solo, o vento frio e o inferno da saudade.

Não que o último motivo seja natural da chuva.

Riu desgostoso. O silêncio em sua própria casa lhe ensurdecia naquele momento.

Não acreditava que aquilo estava acontecendo de novo, o nó na garganta veio cedo dessa vez e apenas uma palavra ecoava na sua cabeça:

P-A-T-É-T-I-C-O.

Como ele ainda conseguia lembrar de cada detalhe daquelas mãos – absurdamente lindas – que lhe passavam segurança nos piores momentos?

Como ele ainda conseguia lembrar das pequenas pintinhas adoráveis distribuídas pelas bochechas que tanto gostava de segurar?

Como ele ainda conseguia lembrar daquele olhar intimidador e intenso que parecia vasculhar todo o seu interior, que parecia descobrir todas as questões que não tinha respostas dentro de seu próprio ser?

Ou melhor, por que ele não conseguia esquecer?

5 anos e nada daquilo desaparecer.

Então continuava enterrando tudo aquilo dentro de si, seu cemitério de sentimentos estava lotado e, em alguma hora, eles levantariam de suas covas contra ele mesmo.

Desviou o olhar da janela para respirar fundo.

Quando voltou seu olhar para aquela paisagem horrível e deprimente do lado de fora de seu refúgio, parou de respirar.

Seus olhos pareciam lhe trair, mas o novo corte de cabelo e o rosto maduro eram tão reais, tão fiéis e, ah, o olhar era o mesmo.

O ar voltou para os seus pulmões e adrenalina tomou conta de todo o seu corpo.

Marchou porta afora naquela chuva odiosa para se deparar com o nada.

Ela não estava ali.

Era só o céu escuro, o som frenético da água chocando-se contra o solo, o vento frio e o inferno da saudade.

Saudade que despertou aqueles que pareciam estar mortos dentro de si.

Despedaçou-se.