" Hoje não, hoje não...hoje sim, hoje sim "
Após um longo período de seca, as águas precipitaram-se novamente no alto da montanha. As chuvas há muito não vistas despencaram torrencialmente, e a montanha não tinha muito o que fazer, a não ser contemplar e se entregar. As águas por sua vez, já exaustas de nublarem o céu e nunca atingirem o chão, jogaram-se contra o solo em paixão desenfreada. Abrindo caminho pela mata, sem pudor, violentamente com a emoção que estava reclusa, e de certa forma temerosa, de novamente não encontrar o caminho. As águas foram descendo, abrindo caminho, parando, estacionando, esperando, para novamente vir com força e abrir mais caminho. A mata abria-se, fechava-se, amedrontava-se, temia e adorava. As águas sabiam o queriam, por mais belo que as matas fossem, que os desafios fossem, as águas sempre querem correr para a imensidão do mar. Após algum tempo lutando, contemplando, aproveitando o momento, a ansiedade e o medo tomou conta das águas. Cada dia era um misto de tentativas e frustração, as chuvas estavam diminuindo como que anunciando o verão, mas esse verão só trazia deserto. Lutando cada vez mais para não evaporar, as águas tentavam dia após dia superar as cadeias de montanhas que as separavam do caminho do mar. Todo dia uma nova tentativa, as chuvas estão ficando escassas; mas as águas estão se acumulando em um só lugar, uma lago, fazendo pressão contra as montanhas, que eram várias e diferentes, mas causavam o mesmo desfecho, separavam do mar. As chuvas pararam, o céu se abriu e clareou, apesar do dia ser lindo para todo mundo, para as águas era uma sentença. Ficaram ali, inertes, um lago. Pensando se não eram fortes o suficiente para superar aquela cadeia de montanhas. Enlutou-se, resignou-se, seria um lago onde viajantes passariam e iriam embora, algum um dia iria querer ficar? Tanto faz, as águas queriam encontrar com o mar, a imensidão a qual pensava que pertencia; estava distante da costa, ou talvez muito perto, mas nunca o bastante. Nunca o bastante, nunca o bastante, não eram mais águas, eram um lago alimentado por si mesmo. Não esperava mais chuvas, em sonhos loucos chegou a imaginar que o próprio mar fosse alagar as montanhas e finalmente iriam se encontrar. Acordou. Há coisas que nascem, crescem, não morrem, mas não acontecem.