- Então, esqueça! Como se esquecer fosse verbo de ligação e não ostentasse um transitivo direto ou indireto como companhia, bem de acordo com o tipo de omissão do sujeito. E por falar em sujeito, na arbitrariedade de sua vontade - como se rostos fossem apagados pela borracha e a lembrança recebesse uma fita corretiva - solta a exclamação que soa como ordem - sem nexo. Simplório conservar no freezer da memória ou abusar da tecla mental “delete” (racionalizada) e ir enviando o lixo cerebral, sem possibilidade de resgate da última ação e, assim, naufragar nas profundezas da desmemória intacta. Fosse assim, dispensaríamos os psiquiatras para lidar com os traumas nossos de cada dia ou despediríamos nossas psicoses por justa causa. Estancaríamos a dor da despedida do primeiro amor - talvez único- feita na troca de olhares entre as malas que eram organizadas no porta-malas. Como se guardar na cápsula do tempo todas as suturas da alma alvejada pelo calibre da incompatibilidade fosse possível. Ah, se o coração recebesse aviso prévio pra descontar do tempo os dias disfarcados de super herói para salvar com canções de amor os soluços engolidos num copo d’água. Bastaria a presença silenciosa com afagos no olhar cujas chamas aqueceriam. Ou a sútil aliança dos dedos em que o ouro era dispensado. Então se senta, solitária, à janela. E com um olhar de ânimo, busca a esquina para se compor de esperança: - Quem sabe ele volta? As alças da dor se rompem na trajetória e com um riso -ainda perdido em algum lugar-, resgata a xícara por ele deixada e se beija, tomando seu café...