Lembrando corretamente
Estive me inserindo nos segundos capturados deste retrato, um movimento ilusório entre as dimensões que compõem o cinza, branco e preto pincelados em figuras, formas e planos na tela. Amar é se despedaçar sem hesitações. Eu, um traço de vida vacante a procura de significado, uma vítima de meu próprio amor.
Caminho em passos
De uma vagarosa dança.
Amar é seguir o ritmo
De algo inexplicável.
O parque estava cheio
De uma multidão
Solitária e perdida,
Observá-la era
Enxergar um reflexo
Aterrorizante, porém
Nada menos que verdadeiro.
Ainda escuto os mesmos sons em minha cabeça: O farfalhar das árvores junto ao contato gentil entre a brisa e o rio raso. Ainda visualizo da maneira correta: O mundo acontecendo em câmera lenta, as pessoas andando e seguindo seus rumos despreocupadas mesmo com o pesar em suas costas e em suas expressões penosas.
É como experimentar o momento pela primeira vez: A culpa transbordando sutil em minhas veias, o choque entre o alívio e remorso, mãos tremendo, o gosto ainda sentido no paladar, o eco das palavras das mesmas frases ditas e repetidas numa infinidade. Amar é não temer dor.
Eu poderia me cercar com estas recordações por um tempo inestimável, eu poderia encontrar coisas que nunca pude notar antes, eu poderia criar incontáveis fantasias e finais alternativos até que eu encontre um sono em meio à exaustão que me esvai de respostas e justificativas. Nada mais me faz fechar os olhos.
Você me olhava
Em tentativas de
Esconder o que
Sua consciência
Não era capaz
De deixar em paz
Toda a guerra
Inegável em nós.
Os dias me esclarecem, me definem e me adaptam a continuar sem sua visão caída sobre minha imagem desvanecendo em confusão e incerteza. Amar é se render à dependência. Preso aos momentos em que não vejo possibilidade de reverter nossas compartilhadas destruições. Sobrevivo enfim com os restos de uma realidade que imitou perfeitamente uma arte efêmera e inesquecível. Amar é construir juntos uma queda solitária.