Nova vida

Permaneci em pé, receoso, porém preenchido pela disposição que fluía em minhas veias e palavras como uma primavera derretendo e desvanecendo os escombros de meu silencioso e insólito inverno. Fui uma metáfora desconstruída em meio aqueles parágrafos o qual me perdi de meu significado, meu nome e as coisas as quais sempre eram ditas por meu ser à procura de definição própria. Letras desembaçadas reganhando compreensão.

Alimentei-me de tempo, nutri-me com cada segundo restante, fortaleci-me pelos dias em que me desloquei para fora daquela inércia incolor, indolor e interminável. Despojei de mim o que agora são fatídicas inspirações a tudo o que me liberta e me permite ser uma constante viva e invencível em meus pensamentos. Perdido, mas nunca desamparado.

O tom laranja, radiante e dócil da tarde pinta as paredes, penetra as rachaduras do teto, deita-se sobre meu corpo em repouso entre a exaustão e entorpecimento os quais me levaram de volta àquele lugar. Tudo estava da maneira a qual deixei: cada móvel empoeirado, espelho rachado e carta rasgada em suas devidas posições. Sou um turista em meu passado.

São consequências e fardos ainda não resolvidos, complicações orbitando-me e me recordando que o fim ainda está a muitos mais passos e mudanças de distância. Imensurável, um caminho de curvas mortais e solo o qual vago à mercê da força que velhas faces me concebem a cada momento em que suas vozes são repetidas a mim como o mais insano devaneio. Eu sou somado, subtraído, divido e multiplicado pelas minhas ilusões.

Ainda recolho os pedaços quebrados, ainda vasculho para encontrar mais algo esquecido, ainda não aprendi a esculpir minhas memórias num molde perfeito o qual escolheria lembrar, ainda ouço música e tiro folgas entre as horas árduas destas tarefas. Mesmo caule, diferentes pétalas.

No vão primitivo de meu próprio conforto, arrastei-me até a fonte daquela luz ofuscante, tateei a saída, cego e surdo, alcançando o que instintos gritaram por impulso. Eu andei cuidadoso e paciente, segurando-me a cada instante da nova vida que encontrei. Tecia-se o começo com as cinzas de tudo o que destruí em minhas mãos. É um delírio tão bonito, uma sobriedade clara e concreta.

Daniel Yukon
Enviado por Daniel Yukon em 15/03/2020
Código do texto: T6888580
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