Ilusão III
Vivíamos sob as sombras projetadas pelos dias em que fugíamos do Sol. Paredes riscadas num esconderijo do quintal, torneira pingando água recém-jorrada, um varal com roupas limpas exalando uma brisa de domingo.
Descalço, caminhei certo de que não me feriria se meus passos fossem a intuição evocada por olhos fechados e direções improvisadas. O anunciar da noite, os sinos da igreja, o fechar das lojas e o desaparecer de vultos guiariam meus sentidos de volta para a porta semiaberta de casa.
Ininterruptas letras
Teciam os capítulos
Como a calma que
Viria antes da história
Começar com o trovoar de
Uma infinita tempestade.
Olhares vorazes
Espiando os cantos
Da mesa de madeira:
Cadeiras vazias,
Jantares meio comidos,
Um rascunho de prosa
Incompleto e abandonado.
Ainda se reúnem na praia como comemoração festiva? Desenham ainda em papeis coloridos as imagens que a mente coletara do sonho passado? Não desistiram ainda de reinterpretar eternamente o que não puderam admitir como uma memória enterrada pelo tempo? Escondem ainda confissões obscuras até que se calem no silêncio definitivo de seus túmulos?
Equilibro-me em náusea de pensar que perdemos algo, de que mesmo se tentássemos procurar, encontraríamos no último lugar imaginável, e mesmo assim, esqueceríamos o propósito daquela busca, não é verdade?
Desvende-me isto:
Nós desamarrados,
Nós em dubiedade de
Que não desejamos
Nada do que temos,
Nós com a certeza
De fomos feitos para
Muito mais que isto.
As árvores as quais nos refugiavam foram desmatadas, o ferro enferrujou e já não badala mais, o comércio da cidade faliu, e não há mais população que viva uma vida simples de preocupações despreocupantes.
Aprenda com estes erros infantis: não se apaixone com o que lhe malfaz lembranças apaixonantes. Não seja o que impulsos deste passado lhe manipule a ser. Não se torne parte desta ilusão, ao contrário, você será quem estará escrevendo variações destas palavras.