Paradoxal

Eu sou uma pessoa paradoxal. Certa vez me disseram que eu era uma pessoa incoerente. Acredito que foi a melhor definição de mim. Eu sempre fui uma pessoa afoita. Eu queria fazer as coisas acontecerem. Marcava festas. Marcava shows. Encontro com amigos. Tive uma vida muito intensa e muito feliz. Os anos foram passando e eu fui mudando muito. Passei a ficar mais em casa, não aceitava os convites de amigos para sair, fui me isolando de tudo e de todos. Eu gosto de ficar sozinha. Eu me involvo com as coisas que faço durante o dia. Às vezes fico meio entediada. Às vezes fico pensando que poderia estar vivendo uma vida melhor. Mas eu não acho totalmente ruim viver assim. Total solitude. Eremita na cidade. Faço um café. Lembro daquele amor que me esqueceu. Dos sonhos que tinha, tão cândidos em seu estado de delirãncia. Não há por que se arrepender. Não foram decisões tomadas pelo homens, foram tempestades que o universo mandou para molhar os olhos dos céticos. Eu carrego meu calvário, com sorriso para a foto. Vai ser doida na vida. Vai ter que ter coragem para dizer impropérios e palavras que cegam. Depois te olharão na rua. E você seguirá altiva com seu meio sorriso e um indisfarsável cansaço que lhe faz cair os ombros. Quem te vê assim tão comum, tão anônima, não sabe quantos mares você navegou, quantas estrelas tocou com com as mãos. Foi um colossal sentimento em sua grandiosidade. Fora-lhe dada o portal da realidade transcendente, assim sem precisar de nenhuma substância. De repente você era feito de força e sentia o sangue correr em suas veias. Eu sou um ser paradoxal. Eu sou egoísta em minha generosidade. Eu sou carrancuda em minha agradabilidade. Eu tenho sanidade em minha loucura. Sou uma mulher de muita fineza. Ainda hoje, com muita classe, taquei pedra na lua.