Quando as teias sussurram...

Devagar um a um aquieta-se o ranger das portas e janelas da casa antiga, quais personagens de um teatro ao fim do espetáculo, de mais uma despedida do dia; maçanetas, ferrolhos e aldravas adormecem...

Na mesa da cozinha, na toalha de xadrez azul ainda permanecem algumas migalhas de pão, lembranças do café da manhã e uma caneca vermelha de ágata com duas flores de dente - de - leão... Ainda no canto da mesa um relógio desmontando (pacientes engrenagens) aguarda a hora de ser consertado.

Há uma atmosfera de beleza desordenada, mas também de solidão, uma solidão imersa em lembranças de outros fins de tardes; sons e aromas, principalmente, do café em grãos deixado no moedor, enquanto na sala um pequeno escaravelho pousa sobre um dos livros de poesias, deixados sobre o sofá, quem sabe... goste de Baudelaire ou de “Indícios Flutuantes” de Marina Tsvetáieva?

Nesse silenciar da sala à meia - luz, observa-se no cavalete duas teias em construção tecidas com esmero e concentração, num dialogar, baixinho, desses mosaicos de rendas, delicadas e fortes, tal qual almas em buscas de respostas de uma superação ao vencer a passagem de mais um dia e à espera de um enigmático amanhecer...