As flores de Maria
Todas as tardes, Maria encontrava estranhamente ao chão da porta da sua casa uma flor murcha.
Maria imediatamente cuidava de colocar a flor num vaso com água e tratava dela com carinho. Conversava com a flor, falava dos seus sonhos, dos seus desejos, dos seus medos, das suas dúvidas em relação à vida e às pessoas... Maria todos os dias ganhava uma flor e não sabia de quem.
Não tinha curiosidade. Que importava quem deixava uma flor à sua porta? Se no pátio da sua casa, as flores que Maria ganhara e não deixara morrer estavam vivas num jardim belo e encantador?
Os anos passavam-se e Maria, à tardinha, abria a porta bem devagar e lá estava uma flor. Uma linda flor! Foram anos e anos. Se contarmos direitinho: meio século. No jardim de Maria as rosas se misturavam. As flores eram a autobiografia viva de Maria. Cada flor era como se fosse uma página de um diário de Maria.
Certa tarde, já cansada da idade, Maria aos seus setenta e três anos, não perdeu o costume de ir buscar sua flor deixada por não sei quem à sua porta. Mas naquela tarde não foi colocada nenhuma flor à sua porta. Nem naquela tarde e nem em nenhuma outra mais. Maria sentiu um aperto no peito, um sentimento difícil de explicar, um choro pra dentro, lágrimas que não caíam, uma solidão enorme. Pela primeira vez, Maria se deu conta do quanto o mundo é enorme e do quanto as flores foram suas companheiras todos aqueles anos.
As flores não foram mais deixadas à sua porta. Não havia explicação. Nunca houve. Maria cuidava do seu jardim pensando na maravilhosa pessoa que lhe deixava aquelas flores todas às tardinhas. Teria acontecido alguma coisa com ela? As flores murcharam com a tristeza de Maria e acabaram morrendo de um dia para o outro. No lugar do imenso jardim sobrou apenas o botão de uma flor, muito frágil, coitado. Maria tratou de se alegrar para não ficar sozinha no mundo. Que importava saber o que acontecera a pessoa das flores? Talvez ela tivesse se cansado ou se mudado para um outro sonho.
O botão e Maria conversavam sobre as coisas mais banais da vida nas tardes frias de inverno. Até o dia em que Maria fechou os olhos para sempre deitada sob a grama verde abraçada ao seu botão que nunca desabrochou. O botão beijou Maria e lhe disse: eu não podia deixar-lhe mais flores depois que me encantei numa delas antes de você, minha doce e amável Maria.