Peixe fora D'água
Peixe fora D'água
Caminhando na escuridão asfaltada você percebe subitamente, o mundo físico é uma ilusão cortante. Talvez, grosso modo, estejamos somente carburando energia de forma despropositada, nesta grande alucinação coletiva e perpétua chamada sociedade. Nós, uma polpa de sangue e ossos, sendo processados pelas lâminas do liquidificador dos desejos. Por baixo da superfície sensível, escutamos o burburinho de vozes clamando por estranhos açoites. Será mesmo que o passado já se calou?
A carne, está incógnita usina hidroelétrica de subjetividades, ensina-nos; que mesmo com as vértebras doloridas os sonhos são ilimitáveis. Na sombra eletromagnética, o peixe fora d’água se desvela toscamente. Olhando em volta ficamos sem resposta, ele foi pescado pelas iscas feitas de drogas ou inocência? Pequeno rabisco gotejado pelo chuvisco confrontando nossa ideia de existência. Peixe incolor, nadando insuspeito, no amontoado de coisas transformadas em nada pelo conceito de lixo. A literatura pode ser pensada como se fosse um poste de luz piscando em curto-circuito.
Virando esquinas e páginas, com os dedos calejados e perfumados pelo café cotidiano, ouvimos que o silêncio na cidade abarrotada é ocasional, um silencioso acontecimento. Ao acaso podemos escutar sua graciosidade muda. Em certos momentos, nesta falta do que falar, é possível que surja o ato performático da escrita. Bolhas invisíveis do pensar sendo estouradas pelas espinhas fictícias do peixe superficial. Esboço incapaz de ser capturado, entendido em seu profundo fora das profundezas. Como um vestígio, ou talvez um sinal, alguém o deixou naquele chão, para ser pescado por outra rede de incertezas?