Sentada na calçada hoje à tarde
Hoje, sentei-me na calçada da minha casa no final da tarde. Quis ver o mundo que existe fora das paredes do meu quarto. Lá estava madrinha Das Neves nos seus noventa e cinco anos, surda e com problemas de Alzheimer sentada na sua cadeirinha de balanço. Lembrei-me saudosamente dos tempos em que passávamos a tarde inteira jogando conversa fora na calçada. As pessoas nunca deviam perder a memória. Ela não se lembra mais de mim. Também vi o sol cair por entre a floresta do mangue perto da minha casa e a noite tomar conta da minha rua cheia de meninos correndo atrás de pipas. Lá na árvore do finado Tenente não tinha ninguém sentado no finalzinho dessa tarde, coisa de estranhar. Neste momento, a rua dorme embalada pela canção da noite. Logo entrei em casa e vim para o meu quarto de onde eu posso ver pela minha janela a lua e as estrelas. É verão no Brasil. As pessoas já se aprontam para passarem as férias nas praias, mas eu tenho mil gatos para cuidar e não posso deixá-los sozinhos. A oração da Ave Maria foi pontualmente às dezoito horas no radinho de pilha de mamãe, exato momento em que estava colocando a cadeira para dentro de casa. Como de costume pedi-lhe a bênção. Tenho saudades de muitos amigos que o tempo me levou e sinto vontade de gritar os seus nomes. Dói a vida em mim. Sentada na calçada hoje à tarde pensei na delícia que era brincar de amarelinha quando criança... eu criança gordinha mal conseguia pular. Acho que vou sentar-me à calçada mais vezes para encontrar-me com as lembranças de um tempo que insiste em dormir.