MANHÃ DE SÁBADO.

Era uma manhã calma de sábado,

Décimo sétimo dia do terceiro mês daquele ano,

Ali eu me encontrava,

No alto da torre sul,

O lado mais sinistro do castelo.

Eu apenas observava,

Lá em baixo,

Vagavam transeuntes indecisos, súditos,

Infelizes obedientes do reino,

trabalhadores atarefados,

Correndo para todos os lados,

Todo ocupados,

Uns, falantes compulsivos, semblantes de falsas alegrias,

Já outros,

Silenciosos e carrancudos,

Faces cerradas.

Ainda sou um prisioneiro na torre de observação,

Proibido de sair pela minha consciência covarde,

Desejoso de passear pela extensão do reino de cristal,

Deveras sou um covarde medroso,

Profundo desejo havia em mim,

De sair naquele dia,

Libertar-me das cadeias invisíveis que me aprisionavam na torre.

Pensava que,

Essa liberdade,

Tão sonhada liberdade,

Seria fácil de se conquistar.

A verdade é que sempre fui o produto concreto dos meus inúmeros medos, fantasmas e pensamentos.

Houve um tempo,

Glorioso tempo,

Em que não havia reino de cristal não havia torres altas,

E tão pouco cadeias que me prendessem,

Havia apenas um ideal,

Doce,

Precioso ideal,

Não havia medo ou covardia,

Um ideal,

Apenas isso e nada mais.

Esse foi um tempo invisível na minha vida,

Uma fenda criada no espaço tempo que se perdeu aos poucos,

Mas hoje,

Anos depois, eis me aqui,

Cercado de tudo,

Sem ter nada,

Sou o que não quero ser,

Mas o tempo, esse cruel carrasco,

Ele soube como moldar este poeta solitário,

Ainda prisioneiro da torre de seus próprios pensamentos.

O beija-flor,

Aquele mesmo de outrora,

Vez ou outra vem me visitar na torre alta,

Ele pousa bem próximo de mim,

Estende suas reluzentes asas,

Balança sua cabeça,

Mexe com sua cauda longa,

Parece querer dizer alguma coisa, eu,

Absorvido por sua beleza,

Apenas admiro com olhar lacrimoso,

Quieto e hipnotizado.

Essa ave magnífica,

Parece saber bem como torturar-me.

Já não sei mais o que fazer,

Às vezes,

O beija-flor,

Em dias mais quentes,

Apenas pousar no muro do castelo,

E observa atentamente qualquer coisa no nada em um horizonte inexistente,

É como se ela não estivesse ali,

Uma mera imagem congelada,

Parecendo uma estátua esculpida,

Enigmática em seu olhar de cristal.

O que passará em seus pensamentos?,

Talvez o beija-flor pense em mim,

Neste poeta da solidão,

Sei, no entanto, que este meu pensamento não é verdadeiro,

É um fruto do meu coração iludido.

Sou este ser misterioso,

Há muito calado,

Tenho mil pensamentos imperfeitos, me sinto como um filho ilegítimo do rei neste reino de Cristal.

O beija-flor,

É ave de outro reino,

O meu grande amor,

Nunca em momento algum ela poderá ser minha,

Não neste reino,

Não nesta vida,

Talvez em uma das muitas dimensões paralelas,

Mas como encontrá-las?

Rendo-me ao cansaço,

Entrego-me ao sono,

Prosto-me diante de mim mesmo,

Vencido de todos,

Prisioneiro de tudo,

Sou apenas palavras ao vento jogadas nesta folha.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 05/12/2019
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