LÁBIOS E LABIRINTOS
Tornou-me um poeta de muitos clichês - Poesia-mor são seus dentes pressionando meus lábios, a tez iluminada pelo bom suor, a voz entrecortada por carnívoros suspiros a chamar-me de "meu príncipe", os braços e pernas a bailarem descompassadamente na noite veloz. Tímidos e andarilhos como duas lebres que dormem, jamais. Seu corpo sobre o meu míngua a magnitude das estrelas do céu (e do mar). É cava, clave, clara manhã. Uma enchente de saliva e poder. O hiato não-belicoso dos tratados desfeitos. A vinha e a seiva. As bodas e a fome. O lixo e o luxo. E suas mãos a desvendar meu íntimo parece navio pirata que, enfim, ascende aos céus e rouba os anéis de Saturno e a beleza de Vênus. A sombra de Lilith, o destemor opulente de Eva, a subserviência de Adão. Cálice e cachoeira. Cânfora e candura. Literatura laudatória. O poema cabralino mal-amado a fazer-se humilhado diante de nossa febre.
Devoremo-nos antes que a crítica especializada teça alguma consideração pomposamente mequetrefe.
Beije-me no areal.