A CADELA CARÍCIA
Teus olhos são tapetes voadores nos quais viajo docemente. Circunscrito a espaço e tempo caminho por insubmissos roteiros. E o pensamento late.
É um cão faminto o corpo sedento de canções e chuvas. A música é o repique arterial que bombeia o sangue dançarino no corpo inesgotado de andar.
Em todos os amantes há um pássaro cantor.
Nem mesmo a soma de todas gaiolas do mundo conseguirão guardar o canto de um único pássaro triste.
E se é alegre o canto, asas voam mais e melhor e não há destino certo.
Os teus olhos verdes, neste recantar de cílios e pálpebras, é o rouxinol do dia, a terna solitude da vertente no canto da lágrima envergonhada de soltar amarras.
A barcarola nos canais de Veneza – lá onde permeia o amante em trágicos passeios de amor e ódio – torna tímido o espírito para o mergulho nunca definitivo, mas sempre derradeiramente profundo.
E o cão Pensamento acaba caçado por vira-latas. Aquelas buliçosas algaravias que de muito sabe, por estripulias noturnas.
Cães de raça passeiam no parque e mijam a grama do Rei.
O amor tange a sua secular linguagem e tudo é mágico como o tempo sumindo nas madrugadas de relvas e suspiros.
A cadela Carícia tem o meu e o teu nome e também demarca com urina o território da posse.
– Do livro EU MENINO GRANDE, 2006 / 2008.
http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/679173