Amadurecimento
Trinta anos. Falo devagar como quem tenta no pronunciar das sílabas digerir o significado de um número. Há dias em que dizer isso soa fácil, como quem conta um punhado de balas. Mas hoje, ao dizê-lo, pareceu-me tão pouco duas palavras para a extensão do que este número representa. Senti-me como uma criança ao aprender a ler: lentamente, tentando juntar as letras e, ao mesmo tempo, tendo que compreender o que elas significam.
Trinta anos. Eu penso trinta anos como quem abraça uma árvore de tronco largo e não consegue alcançar os próprios dedos do outro lado. Assim também me abraço e me escapo na intenção de compreender-me. Meu corpo, que já foi semente, criou flores e raízes: por um lado fixa-se onde está, por outro quer voar com o vento e germinar em novos lugares.
Eu penso trinta anos como quem saboreia lentamente um vinho antigo, e tenta decifrar no paladar as partículas que compõe um todo único. Tento compreender minha vida decompondo-me na percepção de ter vivido mais de dez mil dias. Dez mil vezes em que o sol se pôs e se levantou, e com ele medos e esperanças, choros e risos. Por dentro esse tecido que o tempo compôs, amálgama de memórias onde o coração se embala.
Milhões de vezes em que os olhos piscaram, bilhões de conexões cerebrais. Sabê-lo, no entanto, não é suficiente: os números nem sempre nos ajudam a compreender a imensidão das coisas. Olho para o céu que se estende sobre mim e percebo que não preciso contar as estrelas para saber sobre o sentimento de imensidão que sinto ao olhar para o céu à noite.
Fecho os olhos, respiro profundamente. Falta-me a métrica, mas o gosto por dentro é de infinito.
outubro/2019