Demian

Com você foram embora os versos, os poemas,

Os encontros clandestinos com a insônia a procura

Das portas entreabertas de todos os desejos.

Foram embora o herpes da ansiedade como gritos de liberdade,

Como vôos instantes, serenos, inquietos, sem limites.

Com você veio de mansinho a saudade.

Dos monumentos secretos, das janelas abertas do quarto, das folhas secas poéticas,

Dos livros antigos de Hesse, longe, muito longe.

Foram embora, com sua maneira estranha de ser, as tardes na praça, os brindes sem justificativas, as pirâmides e as antenas atentas.

Foram passando entre os dedos, os sonhos dourados, prateados, cor de rosa, azuis.

As rosas vermelhas, violetas, amarelas, brancas, cinzentas.

Foram escorregando de meu colo,

As ilusões, as facetas, inocentes, indecentes, sutis.

Jogo os dados, mas ainda não balanço na cadeira.

Jogo os dados, mas ainda não tenho os cabelos brancos, todos.

Jogo os dados, e só posso lhes dizer que amadureci.

Com você, lembrando você,

Veio a insônia , que insiste em não dormir,

Recordar,

Feito um instante apenas,

Um deslize da alma.

Sem acordar.

Márcia Rasia