Vinte e Nove
A idade do bom senso. Quando chegamos aos vinte e nove anos enxergamos a estrada da vida sem neblina. É como acordar numa manhã fria, abri a porta e ter diante dos olhos uma estrada de asfalto com aquela longa faixa amarela. A estrada está no centro da natureza e os meus olhos miram para o horizonte. Meu Deus, a estrada é densa, infinita e bela. Senti a vontade de tirar o chinelo e caminhar lentamente descalço, a contemplar as pedrinhas do asfalto antigo, acariciando a seda dos meus pés. Neste terno amanhecer, quando a lua se esconde, as andorinhas celebram os raios de sol entre as colinas. A luz solar banha meu corpo e não há mais sombras, tudo é luz e ouro. Perdi amores e amigos, e só agora percebi o quanto me quiseram, pois a neblina dos anos passados ludibriou as fantasias que agora se descortinam com a aurora da manhã. Eu caminhava para o Norte, e o Sul apontou na bússola. Desnorteou os planos e reajustou os sonhos. A estrada sem neblina é mais segura, mesmo sabendo que não há ninguém ao nosso lado neste mundo moderno. Dos anos passados a única certeza que restou é de que alguém está chegando. Aos vinte nove anos ficamos, talvez, radicais com alguns; com compaixão por outros, e sem perceber amadurecemos sem medos, sentimos a paz e a confiança de uma solitude realista consigo mesmo. Já começo a sentir os raios desse sol da manhã aquecer o asfalto, solto os chinelos (estou de havaianas brancas) ouço uma buzina, e de repente, atrás de mim: um fusca vermelho, parado, de faróis acesos. Não reconheci o motorista com aquele sorriso levemente disfarçado olhando para mim. Sem mais nenhuma palavra, aceitei a carona.