Prosa em verso - Não me apaixonei pelo mar...
Não me apaixonei pelo mar
eternamente em movimento,
eternamente a murmurar.
Serão sussurros de amor
ou cantigas de ninar?
O seu murmúrio constante
me ponho a escutar,
querendo os seus segredos
a custo adivinhar.
Não me apaixonei pelo mar.
Suas ondas sempre ondulantes
põem minha cabeça a girar.
Será o mundo que gira,
ou suas ondas macias
querem vir me abraçar
para em seu berço de musgo
levar-me a repousar
para melhor o ouvir cantar?
Não me apaixonei pelo mar.
O céu azul a refletir,
nele, outro sol vejo brilhar,
serão estrelas de ouro a cintilar
em suas águas profundas
ou os cabelos das sereias
que à tona vêm passear
para com seu canto mavioso
O incauto marinheiro encantar?
Não me apaixonei pelo mar.
Os peixes passam nadando,
milhares... sempre a passar
com suas cores brilhantes
o mar com graça a enfeitar,
os insetos imprevidentes
com gula indo a caçar...
e abanando a calda alegremente
ficando depois a comemorar.
Não me apaixonei pelo mar.
Navios passam ao léo
velozes, ou bem devagar,
contra o céu vão a singrar: o mar
e eu, na praia a os apreciar
com eles o pensamento, deixo vagar.
Muitas voltas ao mundo,
consigo, então, assim dar,
sem mesmo sair do lugar.
Não me apaixonei pelo mar.
As suas areias brancas
macias ao meu andar,
Os pés, afundando morno,
parecem baixinho cantar,
enquanto conchinhas mimosas,
estou eu, a procurar,
ouvindo de leve, de mansinho,
vozes do infinito a murmurar!...
Não me apaixonei pelo mar.
As gaivotas gritando,
passam, cortando o ar.
Os mil segredos do mar
parecem estar a espalhar.
Por que não são mais discretas
e os não podem guardar?
Vejo-me então a perguntar,
e nervosa, fico a as censurar.
Não me apaixonei pelo mar.
Nas suas praias brancas
cheias de vida e calor
garotas de corpo moreno
o sol brilhante a tomar,
rapazes de porte atlético
as ondas espumantes a rasgar
parecem deuses antigos
que aqui nos vêm visitar.
Não... me... apaixonei pelo mar.
Em dia de branda aragem
soprando bem devagar,
as ondas brilhantes, mansas,
ondulantes, preguiçosas,
na praia vêm parar.
Parecem mansos carneiros
que o redil vêm procurar
à tardinha, a repousar.
Não... me... apaixonei... pelo... mar.
Quando bravio, agitado,
ondas gigantes a ostentar,
na praia raivoso a rebentar,
nos enche a alma de espanto
Nos põe em Deus a pensar.
E, sem pensar, começamos a rezar!...
Eu... me apaixonei pelo mar!...
01/06/1994