A caminhar

Na rua a caminhar, sigo, já quase meio-dia, dia quente, é agosto. Vejo um casal, mãos dadas. Não os conheço, nunca os vi. Não sei se me viram.

Por mim os dois passam. Passo por eles.

Na janela um gato, sentado, preguiçoso, despreocupado. Vou, ando, admiro o alto céu, as nuvens brancas.

Para trás ficam o casal, o gato, o céu. As nuvens brancas.

É sempre assim, o tempo desfaz a realidade. O que é deixa de ser, em segundos, rapidamente.

Estranho.

Filosófico.

Caminho. Vejo carros, mulheres. Crianças que vêm da escola.

Um cão a perambular, sem pressa, sem destino.

Portas, janelas e portões fechados. Uma casa em construção, o trabalhador conduz um carrinho-de-mão.

Deparo-me com um vendedor de frutas. Paro. Ele me diz “bom dia”.

Compro tangerinas.

O vento bate nos galhos [das árvores] – as folhas se agitam, balançam delicadamente, harmonicamente.

Uma casa e a placa informando: “Temos Chopp”.

Uma escola. Insetos no rosto.

Na esquina, a padaria vermelha. Outra casa. Alguém no pátio, observando o tempo, calmamente.

Absorto, pensativo.

Vou, e para trás ficam as árvores, o cão, mulheres, crianças, padaria.

O que vi ficou para trás. O que verei também ficará pra trás.

Estou indo, estou a andar, caminhar. Há pela frente muita coisa. Verei carros, cães, crianças, mulheres, janelas, árvores, folhas. Verei de novo o que já vi.

Repetição.

Quando a rua terminar – uma hora ela acabará, não sei o mês, o dia – bem, não terei mais aonde ir.

E não poderei voltar, regredir. Não, o passado está morto, jamais retornará.

Ando - e vejo, a rua terminou.

É o fim.

Salatiel Hood
Enviado por Salatiel Hood em 20/08/2019
Reeditado em 20/08/2019
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