Pousa no graveto de madeira fixado na estrutura de metal, ensaia seu voo e na hora da partida cai, literalmente. Que irracional esse destino, passarinho, a sua natureza não saberia separar, sequer enxergar, o que lhe impedia de voar, se é também que entendia o valor de fazê-lo. Abri a gaiola (que vivia como se casa fosse) e o deixei ir. Parecia amedrontado, coitado. Tanto tempo longe do sopro do vento que se esqueceu que o empurrão era só uma sensação e não um veredicto pra morte (em queda livre). Foi se esquivando de mansinho, como quem sentisse necessidade de permanecer enjaulado, como quem não soubesse viver diferente. Acomodou-se naquela situação de tal modo que sequer vislumbrava a beleza da liberdade, tão sonhada e institucionalizada. Aceitou sem relutar aquela imposição dos racionais que criaram gaiolas que abortam a vida enquanto a natureza perde suas suas espécies. Passarinho voou sem jeito, meio desleixado, meio tonto, um pouco acorrentado, pelo pensamento que insistia em trazê-lo de volta para sua única referência. Queria dizer a ele ao pé do ouvido: - Vai embora passarinho! Voa bem alto e vai fazer seu ninho. Não se prenda à casa onde era enjaulado, vai fazer voo alto, e nunca volte pra cá. Vai embora passarinho, corre. Por aqui não verá amor num toque de bicos, nem na companhia de voo, num início de manhã. Liberdade custa caro (meu caro), não menos que viver numa cela acreditando prestar um favor pra humanidade que te açoita. Ah passarinho! Queria eu ter a sua chance, voar como se fosse o último instante e no infinito desse céu morar. Vai, vai passarinho. Vou dizer que fugiu... E como se o mundo fosse acabar no próximo minuto, volta ele, o passarinho e na gaiola de portas abertas traz o galho pra fazer seu ninho, bebeu água e comeu um pouquinho, subiu no puleiro e continuou a tentar, mas no voo, o passarinho, nem saiu do lugar...