Velho lugar familiar

Não me perdoaria se eu esquecesse. No piscar dos olhos, é como se a antecipação para abri-los novamente trouxesse-me a certeza de que tudo estaria no mesmo lugar de antes, tirando-me a decepção de ver que embaralhados e ausentes estão os fragmentos de memória deste pequeno pedaço de passado. Confusão, sempre em confusão. Do tato nostálgico em que toca os móveis empoeirados, a seda rasgada das cortinas e as folhas das estações anteriores que ficam espalhadas pelo chão- Uma querida decadência.

O amor e o calor ainda são mais que palavras usadas para descrever o que já se passou e não retornou, na infância sem rumos, no fantasma de uma inocência que ainda assombra e intensifica a culpa inevitável. Tão feliz a imaginação se pergunta o presente de todos os residentes deste lar o qual fazia a vida não parecer tão amarga e dura como era. Amigos, irmãos e irmãs, órfãos de destino, profetas de seus futuros incertos, apenas velhas crianças em seus mundos inofensivos assim como utópicos.

Aflitivo em intensão pela saudade em excesso, presa a estas algemas voluntárias, salvando-me do perigo que a liberdade traz ao desbravar as coisas que permanecem escondidas nas ambiguidades de um futuro que desliza e escapa do presente que o segurava. Encolhido e afugentado para poder ver o que está além do agora- O quão lamentável é.

Doce nostalgia que destrói assim como edifica. Esse velho lugar familiar ainda é contagiado pelos sentimentos que o construiu, pelas mágoas que o dilacerou, pelas cinzas que restou, pela emoção agridoce faz o coração bater ao ritmo da melodia que o tempo tocou como sua obra-prima. Ajuda a compreender partes da turbulência do agora, evoca a esperança inexplicável, junta e mistura as peças da enigmática mente, ajuda a encontrar suas partes faltantes.

Cultivando agora as coisas que se passaram. Dúvidas e resoluções ao longo dos novos rumos, certeza e receio presente em suas escolhas, determinação e espírito o qual caminham na beira de cada dúbio resquício da nova senciência que surgiu de tudo isso. Como consequência, solidão, sempre solidão.

Daniel Yukon
Enviado por Daniel Yukon em 05/05/2019
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