RISCOS E RACHADOS
Eu tinha um lindo quadro de amor pendurado na parede de minha solidão. Era rosicler e madrepérola, cintilante nas bordas e açucenas no centro da pintura. Na parede de minha solidão, o quadro definhava a melancolia que jorra do bico de um pintassilgo a cantarolar, pela manhã, na janela do meu coração. O quadro caiu, estilhaçou em mil pedaços e as açucenas murcharam até tornarem-se petúnias-negras que se foram. Na parede de minha solidão está, aos olhos de quem deseja ver, o furo do prego e uma hemorragia rachada. Alguém riscou "saudade" na epiderme de meus dias.