Poço das cabaças
Tive sede, esperei.
Disseram-me haver onças, nunca as vi, nem ouvi. Dizem: onças tem cheiro forte, de bicho, senti não, nunca.
Na casa das galinhas um galo tira do debaixo da asa, a cabeça, e olha no turvo, no que já não é tão escuro, se firma num, e noutro pé, aí nos dois, olhando. No mais, na noite aqui são grilos, rãs corujas, curiangos urutaus, uma festa.
Debaixo da cama um sapo. Só sei, não vi, não ouvi, mas há, sapos são assim, dentro das casas, quietíssimos nem piam.
Um galo grita arrogante, ingênuo e seguro, vendo a noite pelas costas.
Agora posso, vou-me para o poço das cabaças, lá mais em baixo, socado na neblina, no transformar da noite em madrugada, lá sim, tem água boa, fresquinha, de lavar toda secura, saciar, escorrer pelo queixo, pela barba, cair no peito, gelada.
No caminho pés descalços, nas poças d’água luas, muitas, várias, tantas quantas poças posso ver.
Corujas, curiangos, urutaus, saciados, sonolentos bocejam.
Das poças d’água o vão-se as luas, é o avermelhado vindo.
Um lagarto grande, cuidadoso, ausculta o solo úmido e arenoso, levanta a cabeça ouve deliciado, gostando, acho.
Bebe um pouco com sossego, rasteja satisfeito, e vai.
E, daqui vendo, bebendo do vermelho nas possas d’água, num rumor de asas agitadas, todas as cores das borboletas.