Amanheci de saudade, acordado de solidão
Tecido em brumas, desprende-se o dia do cordão umbilical da madrugada. Amanheço em meio à brisa silente que resvala na brancura dos ares. Nas formas geométricas de minha sala, as paredes sussurram pinturas aos rebocos de minha essência. Foi insônia no divã; E pela janela aberta o frio se diverte de arrepios, mas nada tão mais intenso e frio do que a tristeza que por vezes me cobre. Amanheci de saudade, acordado de solidão. O tempo, sem timidez, desfila garboso nos ponteiros do relógio, escravizados à sincronia constante. Assim, a vida rotineira em círculos concêntricos. Salto de um, para em seguida me ver prisioneiro de outro.
Singrei noite adentro nos mares dos sentimentos. Viagem à toa, porque não sei definir entre risos e prantos. O fel das ilusões talvez seja a prova de quem viva só de sonhos. Muitos sonhos são tristes, porque são dependentes da solidariedade alheia para se concretizarem. Essa é uma sabedoria ímpar que não precisa de mestria.
Chego à janela e observo, ainda que meio ofuscado, a imobilidade e indiferença das pedras no jardim. Rodeiam raízes de roseiras, mas não estão nem aí, se o peso delas irá afetar o desenvolvimento da planta. Alguém as colocou ali e cumprem a ordem de estarem no mesmo lugar. Não nutrem esperanças, nem sentires, apenas ostentam a concretude do interno à superfície; E no meio das histórias que presenciam, serão apenas figurantes que ninguém irá lembrar.
Daqui a pouco as névoas se dissipam deixando as coisas se revelarem. Bem diferente das quimeras que adornam casebres e quando estes se sentem castelos, elas se migram e vão habitar somente o fosso da entrada e a torre isolada.