Profundo era o seu sobrenome

Ela era intensa demais para viver de relações rasas: profundo era o seu sobrenome.
Tirava de si uma força que era capaz de encher Sansão de inveja.
Quando no coração tocava, chorava. Assim era em supermercados, cinemas, shoppings, velórios. Não tinha receio de olhares recriminadores.
Repudiava rótulos que eram colocados em pessoas, como se produto fossem.
Rezava em sinal de gratidão, mas por dentro... Esperava um sinal de alerta sobre a condução dos caminhos e acabava reclamando, murmurando.
Sentia que era preciso se libertar, mas era ela que não rompia o lacre interno, faltava-lhe coragem.
Tinha nos pés algumas rosas, mas balançou até que as pétalas caiíram.
Tentou usar as asas para juntá-las, mas sua imaginação estava cética demais para ancorar sonhos.
Era uma incoerência entre amar e ser amada, entre viver e vegetar, entre fazer e esperar. Devia tudo, mas cobrava errado, era a si que outrora ofertaria a prestação de contas.
E quando no silêncio, fim de noite, reclinava a cabeça sobre o travesseiro e vinha uma voz sentenciadora tomando-lhe a mente por completo: não era bem isso que devia fazer.
E ela sonhava acordada, lembrando dos silêncios que a haviam sequestrado, sem resgate;
dos gritos desnecessários que lhe sabotaram os abraços, os beijos, os toques;
dos sinais de alerta que emitia quando o perigo estava em si;
das lágrimas que a aliviaram da dor de um arrependimento, ressentimento, uma mágoa;
da revolução que a havia embalado numa paz inquieta que o coração festejava.
E o sono a pegou de novo. Nem tudo tinha controle... O corpo ficava quieto, mas a mente...
Turbilhando!
Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 19/03/2019
Reeditado em 16/05/2019
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