A caneta sanguinária
_Caneta,
por que pensas ser mais que as letras?
_Você se acha tanto;
veja esta tua pele,
se misturou ao próprio manto.
_Mas quero lhe dizer uma coisa,
você não me é diferente.
_Vai, observe-se!
Esta vendo?
_Nem é transparente!
_Por isso,
não minta!
_Não pra mim.
_Sei muito de você!
_Falo das coisas que povoam sua mente.
_Caneta de uma única tinta,
é isto.
_Este é o resumo do teu discurso;
sua doente!
_Caneta-rainha, você é uma ególatra.
_E sobre eles?
Sim, isso mesmo.
_Digo dos ratos que vivem a sua volta.
_Sinto que nem a ti sejam interessantes.
_Quero vê-los todos distantes.
_Ou melhor, corrigindo,
bom seria vê-los todos na praça.
_Imaginem a cena todos aqui:
Os tambores rufando,
pescoços postos as forcas,
a multidão gritando.
_Em segundos viria a catarse,
a rendição.
_Inúteis membros estalando.
_Ah! Não se comovam por isso,
oh! Meu povo.
_Pois, afinal o que vale um puxa-saco?
_Lhes respondo:
Nada!
_Mas para você, rainha-caneta,
talvez eles tenham a devida serventia.
_As tuas ordens forma-se uma grande fila,
lacaios, capachos;
todos ali.
_Assim ,você ordena:
venham lamber os meus saltos;
não parem,
quero todos!
_Tediosa nobreza,
um bando de chatos.
_É isso o que eu acho.
Atenção corte,
com a palavra a rainha dos ofícios.
_Grande coisa você pensa ser!
_Meu Deus! Que desperdício!
_Vai,
mude a tua face,
torne-se irada.
_Afinal, para mim você não tem disfarce.
_Risque tudo mais uma vez na força bruta,
faça sucos bem profundos.
_Rasgue tudo com tua ponta.
_Mostre a todos aqui quem você é!
_Espalhe o terror sobre estas letras;
não é assim que você gosta?
Que tudo manche!
Que tudo manche!
Não lhes darei meu amor.
_Assim, você diz.
Dar-lhes-eis o meu terror.
_Eu sei,
sempre soube deste teu segredo.
_És a caneta-rainha maquiavélica;
a que expõe todo o sangue sobre o papel.
_Reconheço todos os teus passos,
as velhas linhas do teu enredo.
_Já diziam os velhos sábios:
dai poder a uma caneta;
façam isto e a conhecerão de verdade.
_Caneta sem berço,
você não tem linhagem,
apenas a maldade.
_Quero que saiba que nenhuma alma viva lembrará de ti.
Porque o teu ácido nem de longe tem o gosto do mel;
_Filha das sombras,
você é cruel.
_É cruel!
_Nem mesmo a bondade dos padres,
nem eles.
_Na tua morte ninguém lhe destinará ao menos um terço.
Nada será por ti.
_Nada!
_Olha ,
vou lhe dizer mais uma coisa;
e que todos aqui me ouçam.
_Sei que pagarei este preço,
pois,
a verdade custará o meu fim.
_Acaso pensas que não sei?
_Estou á par dos teus planos sobre mim.
_Provavelmente esta noite tu me mates.
_Por isso,
caneta-rainha,
dane-se!
_A minha língua já não é minha,
é de todo este povo.
_É por todos eles que falo agora;
o teu destino já não demora...
_Rainha louca,
insana!
_Não passas de uma doida varrida.
_Você é a prima-sombra de Margot.
_Se o teu coração bate,
não o faz pela vida.
_São as batidas do terror;
aliás,
nem sei o que você é?
_Talvez um mostro;
sei lá?
_Mas nunca uma mulher!
_Veja este teu olhar,
não há como o disfarçar.
_Aqui! Aqui!
Todos olhem pra mim,
percebam como esta rainha odeia as cores do mundo.
_Oh! Caneta-rainha,
queres que tudo te sejam trevas.
_Pura vaidade para decorar teu leito.
_ Alma sem fundo,
terra sem paz,
nunca foste realeza.
_Uma coisa é certa,
jamais terás o meu respeito.
_Porque você é um eterno abismo em pesadelos.
_Nem mesmo as águas limpas tu poupas,
por onde tua boca toca tudo fica turvo.
_Alma podre,
por onde pisas levantam larvas.
_Veja estes pequenos rebentos;
coitada destas sofridas crianças,
tão novas!
_Como não consegues ver a bondade dos anjos?
Não entendo?
_São apenas pequenos arcanjos.
_Jamais poderiam vir a lhe ofender;
tão pouco ,
ser um perigo o teu reinado de trevas.
_Mas você não suporta estas pequenas fagulhas de luz.
_Quem dera tivesses um pouco de sensibilidade,
poderias ver que não passam de noviços-pirilampos.
_Porém,
ao teu comando ordena:
apaguem todos!
Apaguem!
Não os suporto
_Faz isso sem o mínimo remorso.
_Como você é sádica!
_Se volta contra toda vida,
quer ver a todos mortos.
_É,
nada de bom vem deste teu coração.
Dane-se as crianças sonhadoras.
_Assim, você diz.
_Não passa de um ladra de sonhos.
_Nem mesmo os teus olhinhos a comovem;
quem dera eu tivesse a coragem de os fintar,
não consigo.
_Desventuradas estrelinhas;
sem um céu,
sem um teto,
nenhum abrigo!
_Malévola,
duvido que dentro desta tua alma ainda exista uma mulher.
_Pois,
nem a morte busca dar-lhes de uma só vez
_Não,
prefere que a eles , ela venha gradativa e lenta.
_Tudo faz parte deste teu jogo:
_De vez enquanto,
de quanto em vez.
_Assim,
lhes joga um naco de pão.
_Não é o que o faz com o pobre povo?
_No mais....,
nada de novo.
_Tudo isso me abomina!
_Caneta-rainha,
tediosa,
a "deusinha" do mundo.
_Grande coisa!
_Vai,
pese sobre o papel a tua ira mais uma vez.
_Como você se acha, hem?
_Se coloca acima do bem e do mal.
_A senhora das guerras;
aquela que escreve as próprias leis.
_Que todos agora ouçam as minhas palavras;
elas falam pela verdade,
você não vale nada!
_Uma impostora caneta bastarda.
_E lhe digo mais,
nunca irás para o céu.
Pois, todo o inferno a espera;
por décadas e décadas......
Sei o quanto esta luz a incomoda;
é por isso que a inveja.
_Este fogo sobre os meus verbos são os lumes da verdade.
É o que queimará estas cordas.
_Por que me violas?
_Por que me violas?
_Sorria;
dê as tuas gargalhadas irônicas,
esbanje esta tua ironia,
o teu sádico poder.
_Mas,
quero que todos aqui saibam;
claramente vou lhe dizer:
o teu destino, maldosa caneta,
já te é traçado.
_Tantas almas por ti outrora violadas!
_Jamais dormirás o sono da paz;
juro-te que por nenhum dia!
Terás um fim nada tragicômico.
_Porque todo fogo arde!
_Todo fogo arde!
_Oh! Desafiadora da luz,
pagarás em breve o teu preço.
_Coração sem perdão,
nada de voz restará;
nem ao menos endereço.
_Vaticino agora este teu epílogo.
_Que sobre ti,
venham os anjos das trevas;
que tragam suas labaredas de fogo,
e assim,
que a devorem.
_Tempo,
eu o sinto!
_Venha tempo como a um raio breve,
risque todo este céu!
_Revele tuas chamas.
_Pois,
a voz dos justos vos proclama.
_ E antes que eu me vá,
ruja, o bravo trovão!
_Grande juiz do tempo,
venha com sua carruagem de fogo.
Faça a tua justiça, a leve.
_Rainha-caneta,
os vermes ansiosos a esperam;
que todos as devorem.
_E que nenhuma alma por ti, ore.
Renasça, rosa púrpura!
_Ressurja sobre esta grossa lama.
_Hosana!
_Hosana nas alturas.
Autor: Francisco de Assis Dorneles