a seleção artificial
No final do século 19, um alemão, que ficou muito conhecido pelo seu primeiro nome, Johan, "Seu Johan", depois de ter perambulado por metade do Brasil, auxiliando na construção de igrejas e museus, ou aprendendo o que podia sobre gado e plantio, se estabeleceu em uma cidade no sul do Paraná, após ter se encantado por uma índia da tribo Hareó.
No final do século 19, um alemão, que ficou muito conhecido pelo seu primeiro nome, Johan, "Seu Johan", depois de ter perambulado por metade do Brasil, auxiliando na construção de igrejas e museus, ou aprendendo o que podia sobre gado e plantio, se estabeleceu em uma cidade no sul do Paraná, após ter se encantado por uma índia da tribo Hareó.
Conseguiu comprar um bom pedaço de terra vizinho à aldeia, logo iniciando uma vida agrícola, em um primeiro momento, muito dificultada pela insistência em certos cultivos, um tanto que impróprios para o clima local. Até que sua esposa lhe apresentou uma fruta muito apreciada pelos hareós, e que jamais havia visto. De formato e textura parecidos com os do tomate, porém, muito doce, suculenta. Eram dois tipos, uma fruta avermelhada, brilhosa, e uma esbranquiçada, com manchas amarelas, que era a mais doce e mais consumida pelos silvícolas. Não entendendo o nome indígena da planta, a nomeou "haré" e foi apresentá-la nas feiras das cidades próximas. Teve sucesso, no entanto, apenas com a avermelhada. Apesar de mais saborosa, pela aparência, a branca foi preterida pelos consumidores.
Dois anos depois, praticamente toda a propriedade do Seu Johan estava tomada pelos pés de haré vermelho. Neste período, foi observado que o haré não vingava em áreas distantes da aldeia, sendo atribuído ao tipo de terra o desenvolvimento da fruta. Também foi percebido que a redução dos pés de haré branco, de alguma forma, havia fortalecido o vermelho, tornando-o até maior.
Cinco anos depois, os hareós, que já não eram muitos, pois mais da metade deles havia morrido no século anterior, contagiados pelas doenças trazidas pelos "colonizadores", se viam com a imunidade fraca. Foi traçado um paralelo entre o sumiço da haré branca e a saúde da tribo. Apenas os mestiços, como os seis filhos de Johan, não haviam sido atingidos pelo que entenderam ter sido uma gripe avassaladora. Quem se recuperou, viveu uma vida debilitada respiratoriamente, dentro de uma expectativa muito menor. Em vinte anos, a tribo hareó estava praticamente extinta. Assim como as duas espécies de frutas haré, pois, como foi descoberto, tempos depois, uma planta dependia da outra, já que suas raízes sofriam um processo de integração, resultado de mutações originadas há milhares de anos. Pássaros, outros animais e até algumas plantas também tiveram o desenvolvimento atingido pela alteração no meio. Ciente de que suas escolhas haviam interferido na natureza e na existência da tribo Hareó, Johan, em um curto espaço de tempo, acabou entrando em um estado nervoso que o levou à falência cardíaca.
O exemplo de seleção articial acima é um tanto radical, mas por situar-se em um século mais próximo do nosso, ilustra bem o que o homem fez ao longo de sua "evolução", determinando o que vive e o que não.
Na vida em sociedade, na vida corporativa, a seleção artificial também está presente. Muitos de nós já passaram, ou conhecem alguém que passou, por alguma situação na qual seu mérito poderia lhe trazer algum benefício, mas foi preterido por alguém com alguma "qualidade" ou motivo qualquer que lhe tirou do caminho natural. Tais intervenções acabam desviando as pessoas de sua trilha, atrasando processos e causando retrocessos, além de transformar, muitas vezes, a personalidade de quem se via "na vez".
Vamos ao exemplo exposto pelo futebol brasileiro. Certamente você já ouviu falar de jogadores como Edmundo, Evair, Marcelinho, Mauro Galvão, Djalminha, Alex... Vamos incluir na lista o Romário de 2002 e o Nilmar de 2006. Tais atletas, em mais de um momento na carreira, foram incontestáveis em suas posições. Eram os melhores, e cansavam de saber do fato. Todavia, os treinadores da "Seleção" Brasileira os ignoraram em seus melhores momentos. Algumas pessoas podem afirmar que o perfil de alguns deles não era adequado para o time. Mas outras podem confirmar que o perfil dos mesmos foi marcado pela ignorância que sofreram. Em um ambiente sério, caberia ao gestor, no caso o treinador, o supervisor de futebol, ou quem quer que fosse, chamar para si a responsabilidade de recuperar o atleta, cujo talento era inegável. Porém, sabemos que os interesses no futebol, e em outros meios, muitas vezes, não só pela "questão" financeira, também por vaidade, orgulho, entre outros fatores, acabam atropelando o talento, a capacidade, a possibilidade de melhoria e de constante evolução.
A seleção artificial deixa marcas profundas na história. Na do futebol, sabemos que Zico, Sócrates, Ademir da Guia, Leônidas, entre outros tantos, não conseguiram ganhar uma Copa do Mundo. Mas são reconhecidamente craques insubstituíveis. De certa forma, podemos afirmar que as medalhas que atletas como eles mereciam, acabam colocadas nos pescoços de jogadores que parecem nem ter participado das conquistas. Em alguns casos, fica até parecendo que não participar, até para não deixar o outro participar, era mesmo a real intenção.
23/4/2016