Um olhar sobre as cãs
Do alto de meus tantos e alguns anos, imagino se muito fiz e se segui os planos.
Passando pelo comum a todos, do engatinhar ao querer voar, percebi que daqui, bem agora de onde vejo, perdi precioso tempo ansiando pela satisfação dos inúmeros desejos que os hormônios e os olhos quiseram degustar.
Da escola, da tia, dos afetos e desafetos nem sei se saudades poderei carregar, mas dos amores vividos ah, esses tão à flor da pele sentidos, uma marquinha no peito hão de deixar.
Afinal, pelo amor fomos inspirados e por ele saciados ao longo da vida que tivemos de levar.
Não me prendo às dores vividas. Dessas, por certo, profundamente impingidas, o aprendizado registrado em minhas cãs ajudou na persistência em continuar a caminhar.
Passei por riscos e doenças, e de algumas até me livrei. Uma até hoje me embaça os olhos, e por causa de outra rogo a Deus para que dos bons momentos, filhos e netos jamais me esqueça.
Tenho por companheiro um velho espelho, um amigo que me acompanhou em cada vinco e ruga em meu rosto, marcas tatuadas das alegrias e desgostos. Nada a declarar, assim como meus dentes que foram substituídos por próteses sorridentes, que me ajudam a sair bem nas fotos e minha alegria expressar.
Tenho a fé de ter combatido o bom combate e não pretendo carregar arrependimentos, apenas saudades daqueles que antes de mim se foram e nem adeus pude dar.
Minha partida está cada dia mais próxima que antes mas, até meu ultimo instante, quero gravar na memória e em minha retina, a sabedoria da paz e a serenidade dos dias dos quais vou me despedindo e deixando um “até mais!”.