Ainda em ti, repousa meu sonho de cantos e sonhos
Devo perguntar, sem antes não deixar de admitir minha dificuldade em entender o que faz do homem um ser capaz de destruir sua própria espécie.
É com lágrimas n’alma que constato que esse desvio se escancarou em tempos recentes. Não mais a tolerância. Não mais a mistura. Não mais a amabilidade. Tudo se escancarou.
A dor já está insuportável! O grito sufocado reluta em sair, e se observa em cada rosto certo temor do que virá. O amanhã não oferece a certeza do sol. Nuvens negras tornam por demais o céu pesado. E virá a tempestade. E virão as tormentas. E tudo se transforma como se estivéssemos no mar e com o barco à deriva. Não há porto seguro à vista. Não há terra à vista.
Por baixo do lençol não há corpos que se amam. Existe, por baixo do lençol, soluços incontidos de desespero. A incerteza de quem levantará o lençol faz a espinha tremer. O inaudito, sem face conhecida, porém, possuído de poder máximo, sabe que qualquer ato que cometa, não lhe causará nenhum transtorno. Todos são suspeitos. Todos estão condenados.
Sob as camas, insuspeitos fragmentos de poeira, podem levar à masmorra. A vigília diária não cessa. Todos os olhares são de medo. Todas as atitudes condenáveis. Onde erramos?
Cerram-se janelas e portas. Todos são estranhos e não bem vindos. A sobrinha ignora o tio. Primos romperam laços antes construídos sob os auspícios da eterna amizade. E tudo esqueceu-se. O silêncio impera. A tarde plúmbea parece noite.
Outrora, faz bem pouco tempo, ouviam-se às praças e esquinas, a multidão em festa. A roda da conversa, em si, um fato festivo, dispunha-se sempre a ampliar. As praças e as esquinas estão desertas; ninguém mais conversa.
O vento não trás mais a brisa. Ele arrasta as nuvens que escurecem o céu.
Ainda em ti, pequenina criança, repousa meu sonho de cantos e sonhos. Que com você esses tempos tristes não lhes dê a vitória. Só em ti, repousa o amanhã.