Estou em estado de fúria
Estou em estado de fúria porque amo intensamente.
No peito, um outubro de tigres. Na anca maritima e no costado de escamas fibrila a medusa de esporas. Batalha de agonias como um verão prestes a invadir o perfume de pétalas e fósforos. Uma seda sangrenta nos dentes esse coração florido de selvageria espessa. Ensopando o corpo de bocas, coxas, peitos, sêmen, e um colar de lágrimas e seivas gritando gemidos no trevo da garganta. Cravo o desafio das digitais no sabugo das unhas e entranhas, a sangue frio como um carpinteiro de salivas líricas. Camadas de arrepios, declarações de amor e ódio, profecias, tudo na rude confusão suada da carne, do vapor nas narinas e da urina mapeando a tortura dos passos. Os dias palpitam no umbigo de sol e no ventre de trigo. Iodo perfurando os olhos. Cavo a cintura de sátira. E a virilha de safira e ânfora. Língua cravejada de lobos e labirintos de faunos sustentam o exílio de ocos . Sangue de veludo se agasalha na morte de carnes e beijos até à fadiga desse abismo de medula trêmula sobre a fúria do sino em chama. Tempo de punhais, bandeiras de âmbar, e o negro vermelho nos portais. Ancestrais e antepassados contemplam os contemporâneos na antecâmara do naufrágio e a cinza névoa atraca os pórticos das fronteiras insubmissas. A vulva palpitante de treva e ferida de fúria se dissolve funesta na terra cega e nas escadarias do túmulo de sal, raízes transcorrem como um caralho sob a côncava sombra dos pés escarlates de mármore. Eis o cárcere do silêncio. Contemplamos o inferno!
Rio, outubro de 2017.
Alessandra Espinola