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É tudo um mistério.
A maneira como se movimentam os corpos celestes, o calor, irradiando do sol, sobre a pele, o café fumegando na xícara, suas tentativas desenxabidas de me ver feliz.
Alinhada dentro de mim e alinhavada por entre nós, uma onda nem de luz nem de matéria, mas de linguagem, atravessa tudo.
Digo, óbvio e exasperado, acuado pela perda: Não desatemos este último fio! Criamos, então, um subterfúgio frouxo, nada além de um substituto precário para a distância.
Mais que o tempo, a distância carcome a essência - do amor, da amizade. Nos avizinhamos do amanhã, nos desconhecemos nos detalhes. Nem sequer lhe contei de meu novo afeto poético, você nem sequer se riu de minha delicadeza... morremos aos poucos.
A morte não súbita, o descompasso de nossos relógios, essas (c)sem razões para não amar. É como uma febre. Sente-se como uma febre o primeiro passo da partida definitiva entre a gente.
Cabe na ponta do lápis, nos seus lábios incertos do que dizer, no olhar último que já sabia tudo, do começo ao fim. Ai!
Escorre por dentro um sumo da alma. Não são lágrimas, não é doce... Não sei... Ácido, corrói as paredes dessa substância que vivenciamos em amor e cumplicidade até no minuto derradeiro.
Fico, por dentro, definitivamente nu.
Escrevo pois não posso gritar em praça pública o desatino que é a sua falta se assentando em minha superfície nua. Uma tortura gentil que só se poderia esmaecer em virtude de nem sei o quê... uma esperança que tenho de aplacar essa perda contumaz.
Que é a vida se não uma sucessão de desencontros?