Cidade, palco das injustiças e desigualdades
A noite, tal qual uma dama, junto comigo, caminha avenida. Vestida de negro, se enfeita de luzes e ostenta no alto da cabeça, estrelas e um luar magnânimo. Suas vestes tocam o chão e vestem os cantos de remendos sombrios. Os telhados cobrem famílias; os casebres choram partilha. As desigualdades se miram face a face.
Meninos ao relento, no corpo da dependência química, na ausência da calentura e presença do crime. Mendigos visando retas de marquises, acolchoando o chão de papelão e jornais.
Tantas fantasias nas vitrines das diferenças! Tantas migalhas na cama de cada um! Uns reclamam a insônia em colchão de luxo, outros acordam dolentes da massagem ofertada, pela calçada suja.
Sigo a calçada em suas uniões tortuosas de concretos, construídos uns após o outro, emendando casas e dando passarela ao desfile das pessoas, no ir e vir cotidiano. Comigo a noite, de mãos dadas, ofertando sua presença. Segue imponente, porque sabe que obriga o parto de claridades inventadas.
Tanta magia nas flores desabrochando, mas sempre imperceptível. Tantas realizações laboriosas, para o sustento do progresso e do consumismo. O cansaço pesa nos ombros e na mente. As pessoas regressam para os lares, todas ansiosas pelo aconchego, mas vão temerosas na pressa. Carregam consigo as verdades das desumanidades. A cidade é palco das injustiças e desigualdades. Delinquências e preconceitos. Olhares dispersos em todas as direções. Conflitos da alma, páginas do livro grande que é o querer e poder e o não poder e querer. Contradição gerada pela ganância humana, no mesmo campo de batalha, onde de um lado se aparelham mansões e do outro se acastelam casebres.