QUAL SIMBIOSE DA EXISTÊNCIA

Naquele exato ponto, no qual o tempo dobra os passos, elas se cruzaram...

Ainda não se conheciam, tampouco sabiam que cruzariam, por vezes, pontos em comum.

Vinham pela mesma estrada sinuosa, sempre sem as cuidadosas sinalizações, as de que qualquer existência cobraria, bem lá na frente, todas as suas faturas dos caminhos devidos.

Naquele exato ponto, no qual o tempo dobra os passos, elas se cumprimentaram muito rapidamente, embora ainda não soubessem que o tempo transmutaria as mais imperceptíveis trajetórias.

Algo sensório lhes pareceu familiar...

A primeira, de coração ingênuo, vinha com toda a força que lhe entendia infinita, como o vigoroso ânimo da musculatura que impulsiona os frescos passos de todos os quereres; vinha só consigo, de nada precisava, sempre a olhar para frente , porque ainda não lhe era possível olhar para trás.

Os caminhos lhe eram sempre vindouros, tangíveis às quaisquer das nunca temidas impossibilidades.

Vinha provida com a interminável resiliência de si mesma ao tudo que lhe parecia indeformável.

Tinha o fôlego do mundo...

A segunda, eu também a avistei de longe, vinha já bem a frente, de coração sensível ao toque das florações e de todas as texturas dos caminhos percorridos.

Foram muitas e intensas.

Vinha a degustar todas a estações vividas...

Levava no peito um leve prazer do trajeto cumprido na nítida imperceptibilidade do tempo percorrido com garra, dores e levezas, todavia, vinha sempre na incerteza das próximas curvas.

Já sabia ela que os horizontes mudam como os ventos que sopram sempre à revelia.

Uma leve singeleza decorava sua forte inquietação...

Vinha algo já claudicante, a aprender que , ali, quando e onde o tempo dobra os passos, o filme da caminhada é repassado como um breve sonho do que parece não ter existido, cujas cenas perdidas rumam ao infinito do que não se conhece.

De repente,de novo, vi que ambas se encontraram...

A primeira, nominada VONTADE, parou um pouco para respirar fundo quando o tempo dobrou os passos.

Nada verbalizou, só obedeceu, mas senti que aprendera que, se quisese continuar, nunca lhe seria permitido olhar para trás, embora mister lhe seria seguir lentamente, já a entender o inexplicável, apenas a puxar todos os ares dos fôlegos imputados e mendigados para se ir.

A segunda, nominada SAUDADE, vinha pelo retrovisor donde o tempo dobra os passos.

Olhava para trás a se sentir agradecida pelos olhos já encurtados, algo incomodada pelo coração mole e acelerado.

Se pudesse jogaria a alma pela janela.

Mesmo assim vinha, a honrar o acerto de todas as faturas do caminho, uma a uma, como se fizesse jus às malas para se ter rumado até ali, exatamente onde o tempo dobra seus passos.

Vi que ambas se entreolharam em silêncio.

De fato, pareciam algo familiares...

A primeira ainda vinha, na parca e teimosa VONTADE de ser.

A segunda, na evidente e perene SAUDADE de nunca ter sido.

Foi exatamente ali, aonde o tempo dobra e acelera seus passos, que

"Vontade & Saudade"

se reconheceram ...a seguir juntas para sempre, qual simbiose de existência, na plena certeza de que eram uma só.