A DESCOBERTA DO OUTRO EM NÓS
E era o momento que se esperava, era infinito porque aguardado, durava intensamente por ser breve, epifania que se alonga e se estende, quando passa nos faz perguntar se realmente aconteceu, era o mar em ondas se desfazendo em partículas, águas que se remontam em átomo e molécula, era a energia que surge entre o vácuo, vida que se liberta, espalha-se pelas ruas e queima o asfalto, alquimia a preencher com cores o preto
e branco. Sim; veja só, o branco, o negro, o cinza, devagar vão se tomando pelo dourado e vermelho, pelo verde, veja quanto azul e violeta à volta, prismas de arco-íris em franjas através das fendas do espaço.
Pois temia-se o desconhecido; ah! As histórias dos antigos, os seres desconhecidos, criaturas desformes, habitavam o caos! Era preciso fechar os olhos e
esconder-se, almas eram alvos fáceis, havia a dominação e a escravidão. E assim seguia-se; tudo bastava pois havia apenas o Eu e mais nada, o um e o zero, 1-0-1-0, exato, preciso, estradas previsíveis, o intelecto, dispensável, pois já existiam todas as fórmulas, E=mc² era sempre o mesmo.
Foi quando as cortinas se abriram, os céus tingidos de negro revelaram a luz do astro-rei, a lua cedeu de sua graça às estrelas; quando o manto escuro se desfraldou sobre a cabeça e os olhos abertos passaram a ver; um labirinto, a existência, aquela que se refrata a partir das lentes coloridas no rosto, foi quando se viu que era tudo uma caverna, às cegas, porque tão clara.
Foi quando se viu que havia mais alguém na escuridão; era tão claro que não se via, e ali no escuro era possível enxergar, como pode ser? Não é possível...
Primeiramente, achou-se que era o inimigo, feroz e cruel ser no escuro que aguardava, víboras prontas a oferecer a maçã, a caixa de Pandora pronta para destruir tudo e todos a nos levar para o nada. Mas não sem que alguém caísse. Não; houve Odin a sacrificar seu olho, no entanto recebendo a visão do Universo; houve o que meditava nas montanhas e abandonou a matéria física; houve sábios e seus livros, houve o cético e o crente. Não sem terremotos; não sem maremotos e vendavais, a mente e o corpo em desequilíbrio, o cérebro se processando, epidemias de fome sendo saciadas por ideias? Prometeu, aqui seu presente: uma eternidade de prisão, a dor e o desgosto por trair os Deuses, ah!
Quem dera atirar-me aos mares, encarar o Kraken ou os monstros de Lovecraft, pelo menos haveria o fim.
Mas revelou-se que era uma caverna, a luz saindo da mente a se expandir... Porque eram dois, sim, cada um com um tênue feixe iluminado à sua volta. E havia eu, sim, e havia você; havia ele, havia ela, todo um pequeno mundo se revelava, cada um era como era. As mãos se tocaram, manipularam-se no escuro. Quem és tu...? Não sei. De onde vieste? Sempre estive aqui... Eu também. Mas como pode...?
Perguntas, os sons divagam, as línguas não se encaixam, eu te vejo agora... Por que será... O quê? E tantas coisas a se acertar, tantas falas, tantos lugares de fala, os corpos que se ajuntam e se separam, os que
semeiam e colhem, tudo ao seu tempo, através das dimensões. Os olhos atentos, cada um com uma visão, campos de visão a projetar visões diferentes, princípios da Incerteza, cada um mudava o rosto e a aparência de acordo com o que se observava. Por que tu és
assim? Sempre fui assim. Mas eu também sou… Eu existo, e eu também. Dúvidas, nem sempre podiam se responder.
Era a eternidade se começando, se desenrolando; era a serpente que encontrava a cauda, e tudo assim principiava; era a voz surgindo com o som, os braços e pernas a construir o universo, cordas cósmicas tocando a canção da humanidade, uma espiral nascendo entre quadros e números se estendendo para a eternidade; em suas curvas nasceram o embrião, as conchas, os furacões, as galáxias. E então surgiram casas,
cidades, metrópoles; fez-se o nervo universal, a nervura da realidade; o véu se ergueu das faces e expôs a realidade, sim, tudo o que havia, desde os planetas desalinhados até os simbolismos dos números e das letras ocultas sob os tapetes.
E aconteceu o que muitos temiam, tudo mudado, evolução contínua; o binômio de Newton ao lado da mitologia dos escravizados, o homem branco europeu fora do centro do Universo; 2+2= 4 passou a ser IR equação real e infinita, porque era o Ser, nascendo a partir do Outro, porque o Ser sempre nasce de si, é senhor de Si e do Outro; deixai pois que nasça o Ser do Outro, Gaia yin yang girando no espaço, pois que há sempre o Bem e o Mal, e há mal no Bem e o bem no Mal.