Toque de sublimação

O camarada ia chegando, todo cheio de vazio.
Sem cerimônia, sem delongas, foi lançando de antemão as ideias que tinha no seu coração.
Tanta raiva, tanto choro, tanta dor contida ali...
Que mesmo olhando para os lados só enxergava o que tinha em si.
Subiu no ônibus, resmungou, fez cara feia e se sentou.
Ao lado deste, uma singela forma, de rara e sutil beleza feita em forma de mulher, contrastando com a dureza que já tinha diante de si.
Entre os trancos remexidos que a condução lhe dava, estremecia-lhe o corpo, e a mágoa não cessava.
Já de pouco importava de quem fosse a emoção que de modo premente lhe tingiu o coração, pois só disso se nutria e ia turvando tudo ali.
Em seu rosto, só desgosto, nada bom a se sentir.
E a moça indiferente a toda aquela situação do que transpassava ao peito, do rapaz em dispersão.
Fez um gesto inocente, como quem fosse descer, esperando as contorcidas pernas a lhe favorecer.
E num ato aleatório como alguns possam pensar, suas peles se tocaram e seguiu-se  um olhar.
Tão depressa como um raio, como um fogo a consumir, um sorriso tirou dele, e fez algo bom surgir.
Já a moça foi em frente, e no seu ponto desceu.
O rapaz se fez contente, algo estranho aconteceu.
Descobriu que era carente, isso lhe explicava a dor.
Do seu lado acenava a ela, bem ao lado do motor.
E o ônibus seguia mostrando a movimentação daquela moça que partia sem consciência daquela ação e de todo poder que tinha em seu toque de sublimação...