O ÚLTIMO VOO

O que se pode fazer, é observar o Tempo -, como se o mesmo fosse um velho livro de histórias. E no silêncio que se faz entre a aurora e o ocaso, cerrar os lábios e conceber na memória todo espetáculo que um dia foi a Vida. Não há mais necessidade das palavras porquê somos a origem do gene - a longevidade está em nós e em nossos pais. Somos a celebração diante da eternidade e as nossas culpas são absolvidas porque não fomos Caim e Abel na significação da palavra 'irmãos'. Era o meu pensamento - a ponte entre o meu coração e a sua existência a recobrar o sorriso que não podia ser só seu - era meu também. E será meu até mesmo como forma de protesto diante da tristeza de não mais sabê-lo. Eu havia crescido na sua memória feita de voos sobre as nuvens brancas sopradas pelo vento forte das hélices daquele pequeno avião que nos aproximava do mundo dos anjos: seria você um anjo também?! Como sabê-lo?! Você se foi e nem me disse adeus... Todavia, manter a sua presença nos meus dias é a forma de me manter viva dentro do contexto familiar - assim o Tempo transcorrerá sem que possa me aniquilar. E eu me acostumo cada vez mais a esta solidão transformada em contemplação; porque não há dor maior que a impotência diante destas paisagens imaginarias que eu sei pintar tão bem.

Luciah Lopez

para meu irmão Plínio
(15/04/53 - 29/12/2017)