A verdade
Maravilhoso pouso sobre o jardim. Essa hora úmida que vai de uma ponta à outra do verde. E não termina. O verde nunca termina. Eu não saberia que é hora do almoço, não fosse o eco do corpo. A fome me roubaria os olhos e é possível que o hábito de ser atravessada por jardins já pudesse tê-lo feito. Mas eu respiro o impossível. Recuso o mesmo. Estou atrasada, mas vivo tão fora do tempo que o jardim me é absolutamente pontual. Sou o instante, a outra hora, o caminho e o porto. Embarco no oceânico jardim. Sim. Misturo as realidades. Amei muito os jardins antes de amar o mar. Amo o mar. E amei em Camus um horizonte à altura de uma respiração de um homem. Respiro. Sinto. Sou. O som do meu pensamento pronciando seu nome. Camus. Camus. Camus. Esse mi musical. Essa nota de ausência que há nos bancos chuvosos. Qual rosto chuvoso. Chamo.Toco o piano. Bebo a uva branca. Espero até esverdear. Esverdeio. Árvores compõem em mim. A verdade. Verde como tinta. Eu a invento no jardim. E a alimento de poesia e silêncio.