A Aranha & Eu

Acendo a luz do banheiro, e fito meus olhos vermelhos no espelho. Há duas de mim. Sinto um vulto se movimentar no canto da parede. Uma aranha pequena e escura desliza sobre um fio cuja visibilidade foge dos meus olhos.

Ela não me assusta mais depois de um tempo sendo observada. Levanto a cabeça e viro-me para trás, em cada extremidade de meu teto há ao menos uma delas, talvez me fitando – ou não – devem se enfarar de me olhar de cima diariamente. Eu havia avistado uma semelhante mais cedo, enquanto deixava a água escaldante descer pelas minhas costas e cabelo. Ela também se movia lentamente pelo teto, era escura e miúda. Havia uma chance dela se desprender e cair perto de mim, acontecia esporadicamente, porém, só fiquei parada olhando… que fosse.

Agora, ali, observava cada detalhe deste pequeno animal. Certa vez minha mãe chegou em casa animada, após ter uma tarde de estudos sobre elas (as aranhas), falou muito, especificamente, sobre a tal “Viúva-negra”, pequena, mas ameaçadora…Desde então, costumo identificá-las, todas, com esse mesmo nome, qualquer que seja.

Fito-me novamente no espelho, lá estávamos, dois seres, à noite, realizando alguma forma de movimentação. Minha espécie costuma nos classificar como superior a tais pequenos aracnídeos. Posso dizer que ali, depois de passada a meia-noite, onde não há mais ninguém – somente eu e as aranhas – não percebi a diferença. Talvez tivéssemos muito em comum, esta aranha e eu. Ela subia, eu me fitava. Olhava novamente meus olhos inchados, minha íris totalmente escura, e onde haveria de ser branco, já se avermelhara devido à dilatação dos vasos, talvez. Havia vazio neles. O que haveria de achar a Aranha?

Nada, eu diria. Pois ela parecia ignorar minha presença, focada em sua escalada pelo fio imperceptível. Ah, duvidável viúva–negra, percebi o que ocorria. A Aranha é indiferente a mim. Enquanto eu delineava pensamentos e mais pensamentos sobre nós duas, você segue em frente. Aranha. Por isso gasta bem seu tempo. Ouvi de minha mãe que elas vivem por anos a fio, certamente, vivem tanto pois não ficam se empacando na vida. E as que vivem pouco, decerto tiveram suas vidas ceifadas por nossa espécie ou por outra semelhante. Ainda assim, haveriam de ter vivido cada dia proveitosamente. E eis que eu estava ali, contrariando meu relógio biológico.

E contrariando-a também, com toda aquela luz sobre a pobre Aranha noturna.

Apago a luz e saio do banheiro. Deixo-as em paz.

Indiferente a mim, escala seu fio.

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Invisível.

Oi, pessoal! Tenho um blog recente que comecei a publicar algumas coisas que escrevo, seria ótimo se pudessem conferir!

https://palavraserrantescom.wordpress.com

Obrigada!