O feio
Ele era feio e queria ir para o espaço
Onde não havia espelho em que se olhar.
Queria o vazio de infinitude
E ir onde ninguém mais ousara chegar.
Sonhou muito tempo, esnobou os sorrisos
Temia que tudo vinha lhe acusar
Apontar os defeitos, do rosto, do jeito,
Defeitos que ele mesmo insistia em marcar.
Viveu de angústias, moeu esperanças
De que só noutro mundo poderia ficar.
Não olhava em volta, não pensava primeiro
Montou o seu plano sem enxergar.
Pegou um foguete, tirado de histórias
Vestiu o seu traje sem animação
No fundo não queria ir embora
Mas precisava livrar-se de tanta confusão.
E ele, que era feio e não aguentava,
Subiu numa jornada sem explicação
Por sua janela viu a Terra ir embora
Mas em vez de estrelas só encontrou escuridão.
O maior problema veio logo
E sufocou o restante de determinação
A janela contra o breu virou um espelho
E o feio se olhou, não teve opção.
E orbitou silencioso em seu pequeno foguete
Que em pouco virou sua pequena prisão
Sem ânimo ficou ali diante do espelho,
Lá fora o breu e lá dentro solidão.
Ele refletiu como quem está morto em vida
Ele sofreu por uma velha paixão.
Chorou então arrependido
Por nunca ter se feito uma opção.
Não era feiura o problema que tinha
A feiura estava em seu olhar.
Pois quem abre as janelas da alma
Abre só se for para a luz entrar.