Sobre ser Escritor

É talvez o trabalho mais árduo que um homem toma pra si: o de entrar em contato com a vista do céu e então mostrar para todos, os de baixo e os de cima, como apreciá-la corretamente. Solitário como águia no poleiro, observa de olhos fitados. Tomado de súbito pela humanidade, que cedo desvanece. Afiando aos poucos os olhos míopes de sua onisciência. É ser tudo e nada ao mesmo tempo. Sobe alto mais que as nuvens sem saber como chegou nem como voltar.

Volta a baixo e deseja subir outra vez. A memória apagada, na ponta de um ciclo que se repetirá. Sem saber de onde veio, nunca esquece para onde vai. O guia eterno e sua voz que retumba calma ou feroz num mutirão de cabeças extasiadas. Mergulha no foco absoluto e algumas vezes quase fatal. Certas vezes um fluxo diferente, como um rio que aflui uma rota escura. Está para descobrir. E se sente nu, como se nunca um pioneiro. Mas, como velho sabido, descobre e torna-se mestre de novas águas, como que fossem suas e esperaram sempre por ti.

É a tarefa de quem, com só uma lanterna de cristal, deseja iluminar mundos inteiros. Reiterando para si as peças que se apagam sob as pegadas, para depois, como num relato de experiência vivida, juntá-las num grande panorama que, de forma rápida, será habitado e adorado por outros que o desejarão. Serão passageiros rápidos, mas frequentemente eternos e vez ou outra também se repetirão, tal o mundo que se iluminou.