O CEGO DAS CORES
Eu nunca vi cores. Quero dizer estas cores que alguns veem, que pintam as pessoas imaginariamente e dependendo da cor ela é melhor ou pior. E ainda defendem que a culpa é da cor, como, pois se quem viu a cor foi você? Qual cor você viu?
Não sei qual problema ou prece eu carrego, porque por fora, eu vejo todo mundo tem um mesmo tom.
Um monte, um monte, um monte, um monte de gente e é como se fosse um mar monocromático, porque é todo mundo igual. Mesmo assim já ouvi uns jurarem merecer mais que o outro porque tem cores diferentes. Que cor é essa?
Eu sou sedento mesmo é pelo lado de dentro. Lá tem cores, cores que chegam a escapar nas cavidades da face: tom e luz que lança-se pelo olhar, conforto que atira-se pelo buraco da boca... Chama-se sorriso.
E é no lado de dentro que a gente guarda aquilo que escolhe, que planta e colhe. Não posso ver um ser humano novo que quero logo é explorar o interior. AI, perdem tanto tempo investindo, programando, planejando essa coisa morta por fora. Que é tão frágil, que é tão alterável, que se acaba e apodrece num nada. Mesmo assim dão o maior valor a isso que se muda e até te representa, mas não é essência.
Eu já logo vou dizendo: desmancha, se entrega, que não tenho tempo pra perder com o que você quer que eu veja, eu quero logo ver o que tem de ser visto. Esquece o ensaio, esquece a frase feita, o calor das coisas e a tensão, é o coração e a alma que me fazem perder a respiração.
E se me lembro, até pergunto: de que cor você é? E explico, que eu nunca vi cores.
Eu nunca vi roupas. Ah, não me leve a mal, mas esses panos passam tão despercebidos. O que eles dizem? Tem algum mesmo que faz alguém ser melhor que alguém? Queimam igual, rasgam igual e até ocupam o mesmo tanto no cesto do lixo. Mas o dia que eu ver uma, te aviso!
Meus olhos me enforcam, porque eu não vejo cargos, trabalhos, motivos e salários. Eu não vejo. Uma vez até tive um ataque de risadas quando alguém me contou que podia qualquer coisa porque era filho do dono de alguma coisa... Eu nem vi. É fácil ter pertences, mas ao que você pertence?
Não enxergo isso que chamam de hierarquia, o poder eu já vi, porque ele muda muito mais por dentro do que por fora.
É engraçado pensar que a gente não chegou assim e não vai assim, mas briga tanto pra ter e mudar o que nem se deve ver.
Eu sou sedento mesmo é pelo lado de dentro. Onde as mentiras não se sustentam, onde se sente e não se tem. Onde as maquiagens da vida despencam. Onde se é o que é. Aprende e ensina, e o julgamento tomou chá de sumiço, porque certo errado, razão ou culpa é só ponto de vista.
Então cuidado, porque isso que você está fazendo, pode não ser viver!