SOBRE A MORTE DE UM MENINO
Os pequenos olhos para sempre fechados,
as mãos postas sobre o peito,
os pés juntos e inertes,
a pele de uma palidez de inverno,
a voz calada na garganta
e a alma para sempre livre...
Apenas três meses de vida.
Passagem curta,
passagem rápida.
Muito rápida, entretanto foi bastante
para gravar na alma da mãe
a sua imagem.
De bagagem não tinha nada,
sequer possuía planos.
Por isso, quando partiu
sem querer levou consigo
os sonhos que por ele
a mãe tantas vezes sonhara.
Jamais aqueles olhos inocentes
verão as desgraças do mundo.
Jamais aquelas mãos tão pequenas
terão chances de ferir, ajudar,
agredir, abençoar,
escrever, roubar,
esculpir, tocar,
destruir, acariciar
ou acenar um adeus.
Jamais aqueles pés
irão percorrer
as escuras sendas
dos pecados do mundo,
dançar valsas,
jogar futebol
ou apenas caminhar
sentindo o frescor da relva molhada
pelo orvalho das madrugadas.
Jamais aquela pele saberá
do calor do sol na plenitude dos verões
e nem suará pelo o pão de cada dia,
cada dia mais difícil.
Da sua voz ninguém conhecerá o timbre
pois não pronunciou uma única palavra.
Chorou apenas.
Chorou o sentido choro das crianças
quando a fome, a dor ou outras carências
lhe causaram algum desconforto.
Assim, na calma daquela manhã,
triste manhã,
a sua alma pura de criança,
livre de todas as desgraças deste mundo
retornou ao Criador.
Foi curto o seu tempo
no meio da sua família
mas deixou saudades eternas,
marcas inextinguíveis
em muitos corações.
Foi muito cedo, é verdade,
mas pelo menos retornou enquanto puro,
sem máculas e sem pecados.
Foi para sempre
para o seio de Deus
A Grande Luz
e se fez luz.
Belém, Abril de 1981